
Você sabe quem é Walter Willet ? Para ser breve, ele é médico e também o nutricionista mais renomado do mundo, na atualidade. Professor da Universidade de Harvard, é um grande formador de opinião. Para se ter uma idéia, ele já publicou mais de 1000 artigos e é o segundo autor mais citado da história da medicina clínica.
Algumas palavras do Prof. Willet em sua crítica:
“Esse artigo está fadado a causar confusão. Uma questão central é o que substitui a gordura saturada se alguém reduz a quantidade de gordura saturada em sua dieta. Se ela for trocada por amido refinado ou açúcar, que são as maiores fontes de calorias na dieta americana, então o risco de doença cardíaca permanece o mesmo. Entretanto, se a gordura saturada for trocada por gorduras poli ou monoinsaturadas na forma de azeite de oliva, castanhas e provavelmente outros óleos vegetais, temos muitas evidências de que o risco será reduzido.”
Posso estar enganado, mas senti na pessoa que me mandou o texto um ar de “ARRÁ! Olha o que o maior nutricionista do mundo pensa sobre as gorduras!”.
Vejamos alguns trechos de uma entrevista que ele concedeu alguns anos atrás (grifos meus):
“A idéia de que a gordura saturada era um dos grandes fatores subjacentes da doença cardíaca vem principalmente do trabalho de Ancel Keys, no qual ele observou vários países do mundo, e concluiu que suas taxas de doença cardíaca estavam fortemente relacionadas com a gordura saturada na dieta. Entretanto, ele mesmo reconheceu que era difícil culpar totalmente a gordura saturada, porque havia muitos outros aspectos da dieta e do estilo de vida que variavam entre essas populações…
Estendendo o trabalho de Ancel Keys que mostrava que países com alta taxa de consumo de gordura saturada tinham alta taxa de infartos, houve um grande número de estudos detalhados que observaram o seguinte: se dermos a uma pessoa diferentes tipos de gordura, como isso afetaria o seu colesterol ? E foi notado que a gordura satura aumenta o colesterol sanguíneo, e que a gordura poliinsaturada de óleos vegetais líquidos reduz o colesterol sérico. Então, em meados dos anos 70, o conselho dietário predominante era trocar gordura saturada por poliinsaturada.
[…] É interessante. Nos anos 70 e início dos 80, enquanto a incidência de doença cardíaca estava aumentando, não falávamos sobre dietas com pouca gordura. Falávamos sobre trocar gordura saturada por uma gordura saudável, poliinsaturada. Mas em algum momento no meio dos anos 80, perdemos essa mensagem. Talvez parcialmente porque alguns nutricionistas sentiram que era muito complicado falar sobre diferentes tipos de gordura, e desenvolveram a noção de que deveríamos simplesmente reduzir todos os tipos de gordura. Esse foi realmente o início da cruzada anti-gordura, pró-carboidrato.
Se voltarmos aos anos 60, 70, não era realmente nada sobre limitar a gordura total. Era uma questão de substituição, uma crença forte de que gordura poliinsaturada era boa […]
[…] a piramide alimentar que foi publicada em 1991 é realmente baseada na idéia de que toda gordura é ruim. Entretanto, se gordura é ruim, e você precisa comer alguma coisa, o carboidrato deve ser maravilhoso. Então a base da pirâmide enfatiza realmente grandes quantidades de amido na dieta. Nos dizem que podemos comer até 11 porções por dia, e se isso já não fosse amido o bastante, a pirâmide coloca batatas junto com legumes/verduras, então você pode ter até 13 porções por dia. Isso é uma quantidade enorme de amido.
Bem, essa pirâmide não é realmente compatível com a a boa evidência científica, e estava ultrapassada desde o dia em que foi impressa em 1991 – porque sabíamos, e já sabemos disso há 30 ou 40 anos, que o tipo de gordura é muito importante. Mas isso foi totalmente ignorado.
De certa maneira, precisamos dar crédito à indústria alimentícia por ser responsiva ao que os nutricionistas estavam dizendo. Eles acreditaram ou aceitaram a evidência de que gorduras vegetais, óleos vegetais, seriam melhores que gorduras animais, e isso levou realmente ao desenvolvimento e produção da indústria da margarina – gorduras feitas a partir de óleos vegetais. Mas elas são produzidas por um mecanismo chamado hidrogenação parcial, que converte um óleo líquido, digamos de soja ou milho, em algo como margarina. Acontece que isso foi um erro desastroso, porque no processo de hidrogenação parcial, uma gordura totalmente nova é formada: a gordura trans-saturada. A evidência atual já deixou muito claro que a gordura trans é pior que a gordura saturada.
Infelizmente, sendo médico nos anos 80, eu dizia às pessoas que elas deviam trocar a manteiga por margarina, porque era livre de colesterol, e organizações profissionais como a Associação Cardiológica Americana diziam a nós, médicos, que devíamos promover isso. Na realidade, não havia evidência de que essas margarinas, que eram ricas em gorduras trans, fossem de alguma maneira melhores que a manteiga. E resultou que na prática elas eram muito piores.
Uma das mais desafortunadas consequências não-intencionais da cruzada anti-gordura foi a idéia de que “se não tem gordura, não engorda”. Eu mesmo tive colegas que diziam ao público que você não vai engordar comendo carboidratos. Na prática, fazendeiros sabem há milhares de anos que você pode engordar animais dando a eles grãos, desde que você não os deixe exercitar-se demais – e acontece que isso aplica-se a humanos. Nós podemos facilmente ficar gordos por comer muitos carboidratos, e o público foi direcionado realmente a só se focar nas calorias da gordura, quando devemos ficar de olho em qualquer caloria, não importa de onde ela vem.
A verdade é que durante essa campanha pelas coisas com pouca e sem gordura, o consumo de gordura caiu, mas os americanos ficaram muito mais gordos no período. É claro que havia muitas coisas acontecendo ao mesmo tempo nessa época, mas eu acho altamente provável que esse foco somente nas calorias da gordura em detrimento das calorias dos carboidratos contribuíram para essa epidemia de obesidade.
Não houve muita receptividade nos anos 90, quando levantamos críticas à pirâmide alimentar. Era quase uma crença religiosa de que a gordura era ruim e os carboidratos eram bons.
Quando começamos nossos estudos no final dos anos 70, esperávamos encontrar uma relação entre, digamos, ingestão de gordura e câncer de mama, porque esse conceito já era quase aceito. Mas à medida que os dados se acumulavam ao longo dos anos, simplesmente não encontrávamos riscos mais altos de câncer de mama entre mulheres que consumiam mais gordura. E o mesmo era verdade para câncer de cólon, infartos e diabetes tipo 2. De fato, a percentagem de calorias vindas da gordura em uma dieta não parece estar relacionada a nenhum problema de saúde importante.
A quantidade de gordura não tinha relação com o risco de doença coronariana, mas o tipo de gordura era extremamente importante.
As idéias da nutrição sobre carboidratos quebraram-nos em duas classes: açúcares e os chamados carboidratos complexos, que são na maioria amidos… A idéia empurrada é que todas as formas dos chamados carboidratos complexos são “crianças de revista”, perfeitos em termos de nutrientes, e que deveríamos comê-los em grandes quantidades. É isso que a pirâmide nos diz para fazer. Mas na prática, esses tipos de amidos – pão branco, arroz branco, batatas inglesas – são rapidamente convertidos em glicose, que é açúcar puro, e quase instantaneamente absorvidos pela corrente sanguínea. E são esses os tipos de carboidratos que deveríamos reduzir de verdade nas nossas dietas.
Há diversos problemas com essas subidas rápidas da glicemia depois que você ingere grandes quantidades de carboidratos rapidamente digeríveis.
Primeiro, quando o açúcar no sangue dispara, o corpo quer trazê-lo de volta ao normal. Então o osso pâncreas produz uma grande quantidade de insulina, e como resultado, o açúcar no sangue cai de uma vez. Em muitas pessoas, após 3 ou 4 horas, o pâncreas já produziu insulina demais, e elas ficam um pouco hipoglicêmcias – sendo que a queda brusca da glicemia estimula a fome. Isso não seria problema, exceto pelo fato de que é sempre fácil ir até a geladeira e achar um lanche. Se nós fazemos isso frequentemente durante o dia, podemos acabar adicionando calorias demais ao longo do tempo, e contribuindo para a obesidade.
Segundo, essas altas elevações na glicemia e na insulina tem um efeito metabólico ruim nas frações de colesterol. Especificamente o HDL, o bom colesterol, é diminuído; e o triglicérides, outro tipo de gordura sanguínea que leva a infartos, aumenta.
Terceiro, após muitos anos de demanda por altas quantidades de insulina, o pâncreas tende a colapsar. Nesse momento, nos tornamos diabéticos tipo 2.
Se você tem sobrepeso e vive nos EUA, e for ver um nutricionista, quase certamente você será posto numa dieta pobre em gorduras, rica em carboidratos.
O problema é que essa é realmente a dieta errada para uma pessoa com sobrepeso. Pessoa com sobrepeso em geral tem maior resistência à insulina e são muito menos capazes de tolerar dietas pobres em gordura e ricas em carboidratos.
É uma idéia muito simplista: só porque as gorduras tem mais calorias por grama que os carboidratos, nós deveríamos eliminar ou reduzir as gorduras para controlar a nossa ingestão calórica total. Em outras palavras, para ajudar a controlar o peso. O que é realmente importante é o quão saciante uma dieta é, porque nós temos mecanismos muito complexos que controlam a nossa ingestão total de calorias, e já tornou-se muito aparente que se tivermos uma dieta rica em carboidratos, especialmente carboidratos refinados, é muito mais difícil controlar a nossa ingestão calórica total. Isso é provavelmente porque quando comemos carboidratos refinados, temos essas reviravoltas na glicemia e na insulina que levam à fome entre refeições; enquanto se tivermos uma dieta que é mais rica em gordura, tendemos a ficar mais saciados a longo prazo.
O Dr. Atkins dizia mais ou menos isso 30 anos atrás, que se reduzíssemos nossa ingestão de carboidratos a níveis bem baixos, isso tornaria fácil controlar nossa ingestão calórica e então promover a perda de peso. Acontece que há um grande elemento de verdade nisso. Um número de estudos ano passado observou de maneira muito cuidadosa, comparando dietas pobres em gordura, ricas em carboidrato, com dietas pobres em carboidratos, e em geral as pessoas se saem melhor com dietas de baixo carboidrato, em termos de peso.
A evidência é bastante clara: é perfeitamente aceitável obter mais de 30% das suas calorias a partir da gordura, e provavelmente é até melhor obter mais de 30% das suas calorias a partir da gordura, se é uma forma saudável de gordura…”
Eu fui dar uma lida no artigo, e esbarrei com o seguinte:
- Histórico: Pesquisas nacionais nos EUA mostraram que certos fatores de risco relacionados a saúde, em particular o tabagismo e a obesidade, eram mais prevalentes em veteranos que em não-veteranos.
- Objetivo: O objetivo desse artigo era comparar características ligadas à saúde e ingestas dietárias, entre veteranos e não-veteranos na Coorte Multi-étnica.
- Materiais e métodos: os participantes da coorte (com idades entre 45 e 75 anos), residindo no Havaí e Califórnia, preencheram um formulário postal sobre dieta, histórico médico e estilo de vida, entre 1993 e 1996. As análises incluíram 20.939 hojens (14.975 veteranos e 5.964 não-veteranos) que responderam um questionário sobre o serviço miliar em 2007.
- Resultados: comparados aos não-veteranos, os veteranos são mais propensos a sobrepeso e obesidade (IMC >= 25, 61% x 55%), a serem ex-fumantes (54% x 47%), maiores consumidores de carnes vermelhas e processadas, e menores consumidores de frutas e vegetais. Dentro do grupo dos veteranos, os de menor hierarquia eram mais propensos a serem obesos, ter história de tabagismo, consumir mais carne processada e menores quantidades de laticínios e frutas que os oficiais.
- Conclusão: os resultados implicam que veteranos enquanto grupo estão num risco razoavelmente mais alto de desenvolverem doenças crônicas relacionadas, do que os não veteranos. Comparações da diferença real da incidência de doença e mortalidade entre veteranos e não-veteranos nesse estudo, vai requerer diversos anos de acompanhamento.