Estudo questiona a ligação entre gordura e doença cardiovascular

Artigo traduzido por Hilton Sousa. O original está aqui.

por Anahad O'Connor



Muitos de nós são ensinados há muito tempo de que a gordura saturada, o tipo encontrado na carne, manteiga e queijo, causa doença cardíaca. Mas uma grande e abrangente nova análise feita por um time de cientistas internacionais não encontrou evidência de que comer gordura satura aumenta ataques cardíacos ou eventos cardíacos.

As novas descobertas são parte de um conjunto de pesquisas crescente que tem desafiado o conhecimento aceito de que a gordura saturada é inerentemente ruim para você, e vai continuar o debate sobre quais comidas são melhores para se comer.

Por décadas, os oficiais de saúde tem alertado o público a evitar gordura saturada tanto quanto possível, dizendo que ela deveria ser substituída pelas gorduras insaturadas presentes nas castanhas, peixes, sementes e óleos vegetais.

Mas a nova pesquisa, publicada na segunda-feira (17/03/2013) no jornal "Anais de Medicina Interna", não demonstrou que pessoas que comem níveis mais altos de gordura saturada tem mais doenças cardíacas do que aqueles que comem menos. Nem encontrou menos doenças entre aqueles que comem maiores quantidades de gorduras insaturadas, incluindo as monoinsaturadas como azeite de oliva ou poliinsaturada como óleo de milho.

"Minha aposta é que não é a gordura saturada que deveria nos preocupar em nossas dietas", disse o Dr. Rajiv Chowdhury, o autor líder do novo estudo e epidemiologista cardiovascular no departamento de saúde pública e cuidado intensivo da Universidade de Cambridge.

Mas o Dr. Frank Hu, professor de nutrição e epidemiologia na Escola de Saúde Pública de Harvard, disse que os resultados não devem ser tomados como um "sinal verde" para comer mais carne, manteiga e outras comidas ricas em gordura saturada. Ele disse que observar as gorduras individuais e outros grupos de nutrientes em isolamento pode levar a erros, porque quando as pessoas cortam as gorduras, elas tendem a comer mais pão, cereais e outros carboidratos refinados que também podem ser ruins para a saúde cardiovascular.

"A abordagem de 'único nutriente' está ultrapassada", disse o Dr. Hu, que não esteve envolvido no estudo. "Eu acho que as diretrizes dietárias futuras vão colocar mais e mais ênfase na comida de verdade ao invés de especificarem um máximo para certos nutrientes".

Ele disse que as pessoas devem tentar comer comidas que são típicas da dieta mediterrânea, como castanhas, peixe, abacate, grãos com muita fibra e azeite de oliva. Um grande teste clínico ano passado, que não foi incluido na análise atual, mostrou que uma dieta mediterrânea com mais castanhas e azeite de oliva extra virgem reduzia ataques cardíacos e AVCs quando comparada com uma dieta de pouca gordura e mais amidos.

Alice H. Lichtenstein, uma bioquímica nutricional da Universidade Tufts, concordou que "seria desafortunado se esses resultados fossem interpretados como sugestão para as pessoas voltarem a comer queijo e manteiga excessivamente", citando evidência de que trocar gordura saturada por comidas que são ricas em gorduras poliinsaturadas - ao invés de simplesmente comer mais carboidratos - reduz o risco cardiovascular..

Dra. Lichtenstein, que não esteve envolvida no último estudo, foi a autora líder das diretrizes dietárias da Associação Cardíaca Americana, que recomendam que as pessoas restrinjam a gordura satura a tão pouco quanto 5% das suas calorias diárias, ou aproximadamente 2 colheres de sopa de manteiga ou 56g de queijo cheddar para a pessoa típica que come 2000 calorias por dia. A associação de cardiologia afirma que restringir a gordura saturada e comer mais gordura insaturada, leguminosas e verduras pode proteger contra doenças cardíacas ao diminuir as lipoproteínas de baixa densidade (LDL), também chamada colesterol ruim.

Na nova pesquisa, o Dr. Chowdhury e seus colegas procuraram avaliar as melhores evidências atuais, usando aproximadamente 80 estudos que envolveram mais de meio milhão de pessoas. Eles observaram não apenas o que as pessoas reportadamente comeram, mas medidas mais objetivas tais como a composição de ácidos graxos em suas correntes sanguíneas e tecidos adiposos. Os cientistas também revisaram evidências de 27 estudos controlados randomizados - o padrão dourado na pesquisa científica - que investigavam se a ingesta de suplementos de gordura poliinsaturada tais como óleo de peixe, promoviam a saúde cardíaca.

Os pesquisadores encontraram uma ligação entre gorduras trans, os óleos parcialmente hidrogenados agora sabidamente malignos que são adicionados a comidas processadas há bastante tempo, e a doença cardíaca. Mas agora eles não encontraram evidências de perigos da gordura saturada, ou benefícios de outros tipos de gordura.

A razão primária pela qual a gordura saturada tem má reputação histórica é porque ela aumenta a lipoproteína de baixa densidade, ou LDL, o tipo que aumenta o risco de ataques cardíacos. Mas a relação entre gordura saturada e LDL é complexa, disse o Dr. Chowdhury. Além de aumentar o colesterol LDL, a gordura saturada também aumenta a lipoproteína de alta densidade, ou HDL, o chamado "colesterol bom". E o LDL que ela aumenta é um subtipo de partículas grandes e esponjosas que são geralmente benignas. Os médicos se referem à prepoderância dessas partículas como LDL padrão A.

A forma menor e mais densa do LDL é mais perigosa. Essas partículas são facilmente oxidades e mais propensas a iniciar inflamações e contribuir para a construção de placas que estreitam artérias. Um perfil de LDL que consiste em sua maioria dessas partículas, chamado de padrão B, usualmente coincide com triglicérides alto e baixos níveis de HDL, ambos fatores de risco para ataque cardíaco e derrame.

As partículas menores, mais entupidoras de artérias, são aumentadas não apenas pela gordura saturada, mas por comidas adoçadas e por excessos de carboidratos, diz o Dr. Chowdhury. "É a dieta rica em carboidratos e açúcar que devia ser o foco das diretrizes nutricionais". "Se alguma coisa está fazendo o seu LDL ficar alto, são os carboidratos".

Enquanto a nova pesquisa não mostrou nenhuma relação geral entre a ingesta gordura saturada ou poliinsaturada e eventos cardíacos, há numerosos ácidos graxos únicos dentro desses grupos e houve alguma indicação de que eles não são todos iguais.

Quando os pesquisadores observaram os ácidos graxos no sangue, por exemplo, descobriram que o ácido margárico, uma gordura saturada do leite e laticínios, estava associada com menor risco cardiovascular. Dois tipos de ácidos ômega-3, gordura poliinsaturada encontrada em peixes, também foram protetores. Mas um número de ácidos graxos ômega-6, comumente encontrados em óleos vegetais e comidas processadas, pode apresentar riscos, as evidências sugerem.

Os pesquisadores então observaram os dados dos estudos randomizados para determinar se tomar suplementos como óleo de peixe produziam algum benefício cardiovascular. Não produziam.

Mas o Dr. Chowdhury disse que pode haver uma boa explicação para essa discrepância. Os testes de suplementos envolveram primariamente pessoas que tinham doenças cardíacas pré-existentes ou estavam em risco de desenvolvê-las, enquanto os outros estudos envolveram geralmente populações saudáveis.

Então é possível que os benefícios dos ácidos graxos ômega-3 estejam em prevenir a doença cardíaca, ao invés de tratá-la ou revertê-la. Ao menos dois grandes estudos clínicos projetados para ver se esse é o caso, estão em andamento atualmente.

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