Sai veneno, entra veneno: Cazuza e as gorduras industriais

Notícia bombástica, mas já meio anunciada: O FDA vai exigir que a indústria alimentícia se livre das gorduras trans (a maior parte delas, pelo menos) em 3 anos. Excelente! Mas façamos uma recapitulação histórica:

  • O processo de hidrogenação, usado para gerar as gorduras trans industriais (relembrando, existem gorduras trans naturais) foi inventado em 1890 pelo químico Paul Sabatier
  • Em 1911, foi lançado o primeiro produto comestível com gordura trans: Crisco (a margarina mais vendida do mundo)
  • Em 1940 começaram as pesquisas sobre a ligação entre gorduras trans e câncer. Mas...
  • ... o consumo explodiu a partir dos anos 1950, ainda que as pesquisas sobre o envolvimento de gorduras trans e doença cardíaca já existissem.
  • Em paralelo, a guerra às gorduras saturadas foi deflagrada com força, apoiada pelas idéias do Ancel Keys e pelo dinheiro de caras como o Phil Sokolof ("o maior combatente do colesterol em todos os tempos", bilionário, e que morreu de "falha cardíaca" em 2004 após uma vida inteira de leite desnatado e omelete de clara de ovo)
  • Nos anos 1990, pesos-pesados da nutrição como o Walter Willet resolveram bater forte nas gorduras trans, embasados por estudos fresquinhos
  • E finalmente a opinião pública começou a mudar...
  • Agora, mais de 100 anos depois da introdução das gorduras trans industriais no mercado, e de milhões de vidas perdidas, ela vai sair sem pedir desculpas. Nada a ver, circulando!

É uma grande notícia, mas tem gosto ruim. Se as gorduras trans vão sair, o que é que vai ficar no lugar delas ? A opinião pública sobre gorduras saturadas continua ruim (vide o fim desse post!), e as gorduras insaturadas não-hidrogenadas não têm as propriedades necessárias para dar aos produtos a crocância e validade que a indústria precisa.

Hoje fala-se muito em gorduras interesterificadas – que são produzidas a partir das gorduras trans, mas "não tem os mesmos problemas que elas". 

As interesterificadas estão em uso desde os anos 70 pelo menos, e ninguém tem prestado muita atenção a elas porque o volume é baixo e os estudos são poucos. Os gatos-pingados que já estudaram seus efeitos sobre a saúde se resumem a dizer que "a priori, não altera o perfil lipídico". Ou seja, "não dá colesterol". Uau! Coincidentemente, as trans também não "dão colesterol"...

Será que vamos encarar mais 100 anos de outro tipo de lixo, mais alguns milhões de mortes ? Aí a indústria vai achar outra gordura. E depois outra, e outra... Parafraseando o Cazuza, "transformam a saúde pública inteira num puteiro, porque assim se ganha mais dinheiro".

Sinto muito, Cazuza. Eu fico com o tédio mesmo!

Tire suas conclusões sobre tudo isso, mas lembre-se de que a indústria nunca perde. Ela escuta o que o mercado pede, mas também manobra o que mercado quer...

Dito tudo isso, lá vai a notícia em si.



Artigo traduzido por Hilton Sousa. O original está aqui.



Você pode ter visto a quantidade de gorduras trans listadas no rótulo dos alimentos, mas estava incerto sobre o motivo disso estar descrito lá.

A ingestão de gorduras trans foi ligada a um risco de doença coronariana aumentada, contribuindo para a formação de placas nas artérias que podem levar a infarto. Por esta razão o FDA (N.T.: órgão americano que regulamenta alimentos e medicamentos) exige que o conteúdo de gorduras trans nos alimentos seja declarado no rótulo para ajudar os consumidores a determinarem como cada comida contribui para sua ingestão geral destas. Muitas comidas processadas contêm óleos parcialmente hidrogenados (PHOs), a maior fonte dietária de gorduras trans produzidas industrialmente.

Agora, o FDA está dando um passo para remover as gorduras trans do suprimento de alimentos. Espera-se que esse passo reduza a doença coronariana e evite milhares de infartos fatais a cada ano.

Não mais reconhecidas como "seguras em geral"


Em 2013, o FDA fez uma determinação preliminar de que os PHOs não eram mais "reconhecidos em geral como seguros" ou GRAS (N.T.: sigla em inglês para "Generally Recognized as Safe"). O FDA está finalizando esta ação e determinando que PHOs não são GRAS para qualquer uso na alimentação humana.

"Determinamos assim baseados na evidência científica disponível e nas conclusões de painéis de experts", diz Susan Mayne, PhD, diretora do Centro para Segurança Alimentar e Nutrição Aplicada, do FDA. "Estudos mostram que dieta e nutrição desempenham papel-chave na prevenção de problemas de saúde crônicos, tais como doença cardiovascular e a ação de hoje está alinhada com outras iniciativas do FDA para melhorar a saúde dos americanos, incluindo uma atualização das informações nutricionais nos rótulos", ela completa.

As gorduras trans não estariam completamente eliminadas. Talvez traços, já que ela ocorre naturalmente nas carnes e laticínios. Também está presente em níveis baixos em outros óleos comestíveis, onde é inevitavelmente produzida durante o processo de fabricação. Além disso, as empresas podem solicitar ao FDA permissão para usos específicos de certos óleos parcialmente hidrogenados.

Sobre gorduras trans e PHOs


PHOs, a fonte primária de gorduras trans industrialmente produzidas, são encontrados em muitas comidas processadas populares, como pães, bolos e comidas congeladas que os americanos usam para alimentar suas famílias. PHOs tem sido largamente usados desde os anos 1950 para aumentar a validade e a estabilidade do sabor de alimentos processados.

Mas ao longo do tempo, vários estudos consistentemente ligaram o consumo de gorduras trans à doença cardíaca. Um relatório de 2002, feito pela Academia Nacional do Instituto de Ciências da Medicina encontrou uma correlação direta entre a ingestão de gorduras trans e níveis aumentados de lipoproteína de baixa densidade (LDL), comumente chamado de "colesterol ruim", e por conseguinte, risco aumentado de doença cardíaca.

Mayne diz que o FDA começou a requerer que as gorduras trans sejam listadas no rótulo de informações nutricionais em janeiro de 2006. Muitas companhias responderam voluntariamente, mudando a formulação de seus produtos para reduzir ou eliminar as gorduras trans ao não usar PHOs; e os consumidores começaram a considerar os alertas sobre a saúde cardíaca em suas escolhas alimentares.

Entretanto, Mical E. Honigfort, um oficial de segurança do consumidor no FDA, diz que alguns fabricantes ainda usam PHOs nas comidas processadas. Alguns exemplos de alimentos que podem conter PHOs incluem:

  • Cream-cracker, biscoito, bolo, tortas congeladas e outros produtos assados
  • Lanches como pipoca de microondas
  • Margarinas em barra
  • Cremes industrializados para acrescentar no café
  • Produtos de massa congelada
  • Coberturas prontas para usar

Agora que os PHOs não são reconhecidos em geral como seguros, o FDA está estabelecendo um período de 3 anos para adequação. Isso vai permitir à indústria gradualmente abandonar os usos restantes, ou buscar a aprovação de outros aditivos alimentares para esses usos.

O que o consumidor deve fazer ?


Nesse meio-tempo, o que o consumidor deve fazer se ele pegar uma de suas comidas favoridas e ver que ela contém gorduras trans ? A melhor coisa a fazer é considerar a quantidade de gorduras saturadas e trans. Escolha os produtos que têm a menor quantidade destes nutrientes, diz Mayne.

Mesmo se um alimento afirme na embalagem que tem "0g de gordura trans", é uma boa idéia olhar a lista de ingredientes no rótulo, diz Honigfort. Pelas regras atuais, as empresas podem afirmar isso se o alimento contém menos de 0.5g de gordura trans por porção. Mas se há PHOs listados entre os ingredientes, o produto vai conter uma pequena quantidade de gordura trans. A escolha de muitos alimentos com pequenas quantidades de gordura trans pode somar-se e virar uma ingestão significativa.

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