O que causa doença cardíaca? Parte 8

Artigo traduzido por Larissa Hashimoto. O original está aqui.

por Malcolm Kendrick


O Processo de cura



A maioria das pessoas, quando pensa sobre placas ateroscleróticas, imagina que elas começam bem pequenas, como um fiapo gorduroso ou coisa do tipo. Então elas inevitavelmente ficam maiores e maiores ao longo dos anos. Entretanto, isto não está correto:

Aterosclerose foi originalmente considerada um processo contínuo que estava inevitavelmente associado à idade. Entretanto, placas são muito dinâmicas, e são capazes de progredir, estabilizar ou regredir dependendo do ambiente que as cerca. Uma grande parte da pesquisa foi focada em entender o envolvimento da lipoproteína de alta densidade na regressão da placa aterosclerótica. Contudo, a regressão de placas ateroscleróticas inclui uma variedade de processos que podem ser agrupados em três áreas principais: remoção de lipídios e material necrosado; restauração da função endotelial e reparação de áreas descobertas; e cessação da proliferação de células musculares lisas vasculares e reversão de fenótipo.[1]

Em resumo, a progressão não é inevitável. Placas podem diminuir de tamanho, a proliferação de músculo liso (frequentemente considerada um dos componentes irreversíveis das placas) revertida, e a função endotelial restaurada. Na verdade, você provavelmente não vai chegar a ter uma placa completamente curada sem nenhum sinal de que um dia existiu. Você vai ficar com um pouco de “cicatrizes” ou algo do tipo. Porém, o ponto principal é que esta não é uma via de mão única. O corpo pode curar as placas. (Provavelmente antes que calcifiquem, mas esse é outro problema).

Isto me leva à terceira parte do processo da DCV (Doença Cardio Vascular). Como eu estava explicando nesta série, o processo da DCV tem quatro componentes básicos:

  • Dano Endotelial
  • Formação de coágulo/formação anormal de coágulo
  • Reparação do coágulo/reparação anormal do coágulo
  • O final, e fatal, coágulo de sangue


Até agora eu tenho falado principalmente sobre dano endotelial e formação de coágulo, que são fatores de “crescimento” de placas. Contudo, reparação é também muito importante. Qualquer coisa que possa interferir no processo de reparação fará as placas crescerem, ao invés de regredirem.

Os principais agentes de reparação são: monócitos, macrófagos e Células Progenitoras Endoteliais (CPEs). Como mencionado muitas vezes, uma vez que o endotélio sofre um dano, e um coágulo é formado, CPEs são atraídas para a área para criar uma nova camada de endotélio. Então, obviamente que CPEs são agentes decisivos. Apenas para citar um artigo:

CONTEXTO: Fatores de risco cardiovascular contribuem para aterogênese ao induzir dano de célula endotelial e disfunção. Nós supusemos que células progenitoras endoteliais obtidas no tutano do osso têm um papel na reparação endotelial contínua e que a movimentação debilitada ou a falta destas células contribui para a disfunção endotelial e a progressão da doença cardiovascular.
CONCLUSÕES: Em homens saudáveis, os níveis de células progenitoras endoteliais pode ser um marcador biológico para função vascular e risco cardiovascular cumulativo. Estas descobertas sugerem que dano endotelial na ausência de células progenitoras suficientes circulando pode afetar a progressão de doença cardiovascular.[2]

O que significa que com menos CPEs, as placas crescem mais rapidamente.

O papel decisivo que as CPEs têm que desempenhar também é percebido em pacientes que passaram por angioplastia, ou stents. Imediatamente após o procedimento, o tutano do osso começa a produzir mais CPEs.

Em conclusão, dano endotelial causado por angioplastia pode levar à mobilização ou endereçamento (homing) de CPEs. Subpopulações maduras de CPE são ativamente mobilizadas e podem contribuir mais para a reparação endotelial; e a amplitude de mobilização das principais subpopulações de CPE é influenciada significantemente pelo grau de dano endotelial e certos fatores clínicos.[3]

Por isso, se você possui menos CPEs, o risco de Doença Cardiovascular será muito mais alto. Isto é claramente observado no Lúpus Eritematoso Sistêmico (LES, mencionado algumas vezes anteriormente). O artigo citado abaixo examinou o LES, o número de CPEs, e também Células Tronco Hematopoéticas (CTHs), que são precursoras dos CPEs, encontradas no tutano do osso:

Pacientes de LES possuem níveis mais baixos de CTHs e CPEs, inclusive durante a remissão clínica. Nossos dados sugerem que a apoptose (morte celular) aumentada de CTHs é a causa subjacente desse esgotamento. Estas observações indicam que o reparo vascular endógeno mediado por células progenitoras é prejudicado no LES, o que pode contribuir para o desenvolvimento acelerado de aterosclerose.[4]

Outras condições, ou fatores, que reduzem a contagem de CPE incluem:

  • Diabetes tipo 2
  • Avastin
  • Artrite Reumatóide
  • Fumo


Para citar apenas quatro.

É claro que costuma haver uma associação estreita entre os fatores que danificam as células endoteliais e os fatores que reduzem a contagem de CPEs. Isto parece ser determinado pelos níveis de óxido nítrico. Qualquer coisa que aumente o nível de óxido nítrico nas células endoteliais e também ajude a protegê-las de danos parece aumentar a produção de CPE no tutano do osso.

Uma lista não-exaustiva de coisas que podem fazer isso são:

  • Exercícios
  • L-arginina/L-citrulina
  • Inibidores da ECA (usados para redução de pressão arterial)
  • Estatinas


Sim, as temidas estatinas... Buuuu! Na verdade, por muitos anos eu aceitei (ainda que com grande relutância), que as estatinas apresentam alguns benefícios na DCV. Não o bastante, em minha opinião, para superar os danos que podem causar. Porém, o benefício está lá, é real.

Eu sabia que não tinha nada a ver com o impacto das estatinas em diminuir o LDL, já que o LDL não tem nenhuma relação com a DCV (bem, quase nada). Então tinha que ser outro efeito. E este efeito tem, em minha opinião, tudo a ver com a habilidade das estatinas de aumentarem a produção de óxido nítrico (ON):

A biodisponibilidade de Óxido Nítrico endotelial (ONe) é reduzida severamente depois de um infarto de miocárdio (IM) e em quadros de insuficiência cardíaca. Estatinas aumentam a disponibilidade de ONe por aumentar a produção de ONe e reduzir a inativação de ON. Por este motivo nós estudamos o efeito causado pelo tratamento com estatina na disponibilidade de ONe depois de um infarto do miocárdio e testamos seu papel na mobilização de células progenitoras endoteliais, neovascularização do miocárdio, disfunção ventricular esquerda, remodelação e sobrevivência após IM... As descobertas sugerem que a disponibilidade aumentada de ONe é necessária para a melhoria, induzida pela estatina, da mobilização de células progenitoras, neovascularização do miocárdio, disfunção do ventrículo esquerdo, fibrose intersticial e sobrevivência após IM. A biodisponibilidade de ONe após IM provavelmente representa um alvo terapêutico importante na insuficiência cardíaca após IM e media efeitos benéficos do tratamento com estatina após IM.[5]

Sim, quando você decide olhar por um prisma diferente, você pode descobrir que aquilo que você pensou que era uma coisa, acaba sendo outra completamente diferente. Professor Michael Oliver, um crítico incisivo da hipótese do colesterol antes da chegada das estatinas, mudou de ideia depois que viu que as estatinas diminuíam o LDL e diminuíam o risco de DCV. Caso provado, ele disse.

Não, caso não provado. Se ao invés disso, você observar CPEs e o óxido nítrico (ON) partindo do ponto de vista de que a DCV é devida à disfunção endotelial, coagulação do sangue e reparação prejudicada, você pode ver exatamente onde as estatinas se encaixam neste quadro.

Referências

  1. http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC3209544/
  2. http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/12584367?dopt=Abstract
  3. http://www.spandidos-publications.com/etm/10/2/809
  4. http://ard.bmj.com/content/early/2007/02/28/ard.2006.065631.abstract
  5. http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/15466656


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