Por que jejuar ? Parte IV - Saúde cerebral
Artigo traduzido por Hilton Sousa. O original está aqui.
Essa é uma série de artigos sobre jejum:
1 - Por que jejuar ? Parte I - Perda de peso
2 - Por que jejuar ? Parte II - Câncer
3 - Por que jejuar ? Parte III - Longevidade
4 - Por que jejuar ? Parte IV - Saúde cerebral
5 - Por que jejuar ? Parte V - Exercício
6 - Por que jejuar ? Parte VI - Escolhendo um método
7 - Por que jejuar ? Parte VII - Perguntas e respostas
8 - Mulheres e Jejum Intermitente
2 - Por que jejuar ? Parte II - Câncer
3 - Por que jejuar ? Parte III - Longevidade
4 - Por que jejuar ? Parte IV - Saúde cerebral
5 - Por que jejuar ? Parte V - Exercício
6 - Por que jejuar ? Parte VI - Escolhendo um método
7 - Por que jejuar ? Parte VII - Perguntas e respostas
8 - Mulheres e Jejum Intermitente
Praticamente cada característica do corpo humano podeser encontrada, de uma forma ou de outra, em outras espécies. Polegares opositores ? Excelentes para construir coisas e usar ferramentas, mas os macacos os tem também. Mesmo o panda gigante tem um osso sesamóide opositor que funciona como um dedão. Bipedalismo ? Nos ajuda a evitar luz solar direta e a carregar objetos enquanto nos movemos pelo ambiente (entre outros possíveis benefícios), mas há muitas outras criaturas que andam eretas, como pássaros e o Pé Grande. O pé humano ? Ok, nossos pés são bastante exclusivos, mas todos os "pedes" tem pés (apenas tipos diferentes), e todos eles funcionam bem para circular por aí. Então, o que é que nos faz tão diferentes de outros animais (porque deve haver alguma coisa) ?
O que realmente nos separa do resto do reino animal é o cérebro humano. Outros animais tem cérebros grandes e complexos o suficiente para ajudá-los a procurar comida, abrigo e água, enquanto processa e age baseado em dados sensoriais do ambiente ("evitar obstáculo" ou "isso tem cheiro de comida" ou "eu estou com sede, onde está a água ?"), mas eles não compartilham a capacidade do cérebro huamno de auto-reflexão e pensamento simbólico. É a massa pensante feita de colinas gordurosas e vales gelatinosos que está no topo da nossa espinha que nos deu é dá a arte, literatura, arquitetura, agricultura, energia nuclear, sintaxe, filosofia, propaganda, sociedade, o laptop no qual estou digitando esse artigo, e o smartphone no qual você o lê. Resumindo, nossos cérebros nos fazem humanso. Sem ele, nós não seríamos nós.
Eu não sei a seu respeito, mas eu gosto de ser humano. Gosto de contemplar minha própria existência, de ser entretido por horas por estranhas inscrições em páginas superpostas de polpa de madeira seca e comprimida, de jogar Ultimate Frisbee, e se eu vou continuar a apreciar tais coisas, preciso proteger o meu cérebro e mantê-lo saudável. E se quero desfrutar desse planeta e experienciar tudo o que ele pode oferecer até que eu caia morto, eu vou precisar de quanto funcionamento cerebral for possível (uma vez que, você sabe, o cérebro é que comanda a experiência de todas essas coisas) enquanto envelheço. Felizmente, jejuar parece oferecer 3 benefícios protetores e terapêuticos para o cérebro:
Jejuar aumenta a autofagia neuronal
Eu já citei esse estudo antes, mas vou fazê-lo novamente porque ele é central ao tema do artigo de hoje: “jejum de curto prazo induz autofagia neuronal profunda”. Autofagia, ou "comer a si mesmo" é o processo pelo qual as células reciclam material descartado, regulam para baixo processos cheios de desperdício e reparam a si mesmos. A saúde cerebral é altamente dependente da autofagia neuronal. Na prática, um estudo recente mostra que a remoção de um "gene essencial à autofagia" nos neurônios hipotalâmicos de fetos de ratos resultou em um desarranjo metabólico (mais gordura corporal, baixa tolerância à glicose) e prejudicou o desenvolvimento neuronal. Outro estudo mostra que o rompimento da autofagia neuronal induz neurodegeneração. Colocando de maneira simples, sem o processo de autofagia, os cérebros não se desenvolvem propriamente e nem funcionam do jeito que deveriam.
Jejuar aumenta os níveis de Fator Neurotrófico Derivado do Encéfalo (BDNF)
BDNF é uma proteína que interage com os neurônios no hipocampo, córtex e prosencéfalo basal (as partes do cérebro que regulam a memória, aprendizagem e funções cognitivas de alto nível - coisas unicamente humanas). Ela ajuda os neurônios existentes a sobreviver enquanto acelera o crescimento de novos neurônios (neurogênese) e o desenvolvimento de sinapses (que são como linhas de comunicação entre neurônios). Baixos níveis de BDNF estão ligados à doença de Alzheimer, e suplementação de BDNF previne morte neuronal, perda de memória e deficiência cognitiva em modelos animais de Alzheimer.
Jejuar aumenta a produção de corpos cetônicos
Corpos cetônicos como o hidroxibutirato são famosos neuroprotetores, e jejuar geralmente induz a cetose.
Autofagia aumentada e BDNF e corpos cetônicos vindos do jejum soa fabuloso, mas eles manifestam algum benefício real à saúde neurologic ? Vamos ver o que a pesquisa diz..
Nenhuma discussão sobre a pesquisa de jejum e saúde neurológica está completa (ou sequer pode ser iniciada) sem incluir Mark Mattson. Mattson, neurocientista chfe do Instituto Nacional do Envelhecimento, tem produzido artigo atrás de artigo sobre os efeitos neurológicos do jejum intermitente pela última dúzia de anos, e acumulou um corpo de conhecimento que sugere que o JI pode induzir a neurogênese e proteger contra danos cerebrais e doenças. Nas sessões a seguir, vou discutir a evidência - de Mattson e outros pesquisadores - dos benefícios de jejuar sobre a saúde neurológica em um espectro de condições.
Derrame (AVC)
O tipo de derrame mais comum é o isquêmico (compõe cerca de 88% de todos os AVCs) - eventos vasculares cerebrais nos quais um vaso sanguíneo que supre sangue ao cérebro é bloqueado por um coágulo. Sem sangue, o cérebro não consegue receber oxigênio ou nutrientes, e (geralmente permanente) dano cerebral pode ocorrer. Em um modelo animal do AVC isquêmico, jejuar regulou o BDNF e outras proteínas para cima, reduzindo a mortalidade e a inflamção, e aumentou a função e a saúde cognitivas. Entretanto, vale notar que jejuar foi mais efetiva contra derrame em animais jovens, que desfrutaram um aumento de 4 vezes do BDNF neuroprotetor e neurogerador. Ratos de meia-idade experimentaram um aumento de 2 vezes no BDNF, enquanto ratos mais velhos não tiveram aumento. A função cognitiva pós-AVC teve uma relação similar com a idade e tipo de alimentação; ratos jovens e de meia-idade retiveram muito mais que ratos velhos e que ratos alimentados. Ratos em jejum apresentaram níveis menores de citocinas inflamatórias, mas esse efeito também foi modulado pela idade. Via de regra, o jejum aumentou as proteínas neuroprotetoras e diminuiu as citocinas inflamatórias em ratos jovens e de meia-idade, reduzindo então o dano cerebral causado pelo derrame.
Trauma cerebral
Pesquisa indica que jejuar também é efetivo contra traumas físicos no cérebro. Não é que jejuar de alguma maneira repila fisicamente o trauma gerando um campo de força mágico de corpos cetônicos; é que jejuar reduz o estresse oxidativo, a disfunção mitocondrial e o declínio cognitivo que normalmente resultam de trauma cerebral. Empregando uma dessas engenhocas, pesquisadores induziram um "impacto cortical controlado" em ratos em jejum e descobriram que um jejum de 24h (mas não um jejum de 48h) era neuroprotetor. Talvez o apetite reduzido que geralmente acompanha uma concussão seja um mecanismo protetor ao invés de simplesmente um efeito colateral irritante ?
Ferimento na coluna cervical
Jejum dia-sim-dia-não foi neuroprotetor, seguindo um ferimento na coluna cervical de ratos. Apesar de trauma extenso, ratos em jejum melhoraram seu padrão de marcha, exploração vertical e função dos membros anteriores (todos altamente dependentes do funcionamento cerebral). Integridade neuronal foi preservada, volume da lesão cortical foi reduzido, e o brotamento de axônios corticoespinhais (fibras nervosas) aumentou. O mesmo time realizou um estudo similar em ratos sofrendo de dano na medula espinhal, mas teve resultados bem diferentes; jejum em dias alternados falhou em dar qualquer benefício funcional ou neuroprotetor aos ratos lesionados. Como podemos reconciliar essas conclusões aparentemente contraditórias ? Bem, nos ratos que experimentaram neuroproteção, o jejum aumentou a produção de corpos cetônicos em 2 ou 3 vezes. Os ratos em jejum nunca entraram em cetose. Cetose foi a chave.
Doença de Alzheimer
Em um modelo de Alzheimer em ratos, tanto o jejum intermitente quanto uma restrição calórica de 40% conferiram benefíciso cognitivos e comportamentais quando comparados a ratos numa dieta de controle. JI e restrição calórica mostraram níveis mais altos de comportamento exploratório, e, quando colocados em um labirinto aquático de Morris, descobriram a plataforma de escape mais rápido que os ratos de controle. Entretanto, apeans os ratos em JI mostraram evidências de proteção contra patologia sináptica - uma marca registrada da doença.
Doença de Huntington
A doença de Huntington é caracterizada também pelo esgotamento dos níveis de BDNF. Em um modelo da doença em ratos, jejum intermittente normalizou os níveis de BDNF, enquanto a alimentação regular os manteve baixos. Ratos em jejum viveram mais e até mesmo experimentaram melhor tolerância à glicose do que ratos alimentados à vontade. Segundo consta, o jejum reduziu a progressão da doenaça de Huntington.
Declínio cognitivo relacionado à idade
Nós todos tivemos uma vovó que nos chamava pelo nome do nosso irmão, ou um vovô que esquecia desembrulhar a bala antes de colocá-la na boca - esses são os inocentes, simples, singulares, aparentemente inevitáveis declínios na cognição que acompanham o processo de envelhecimento. Bem, talvez eles não sejam inevitáveis. Apesar de a maioria das pesquisas se focar em trauma neurológico e doença, há evidência de que jejuar é bom para o declínio cognitivo básico relacionado à idade. Eu acho interessante que isso aconteceu com início tardio do jejum intermitente, significando que ratos mais velhos que começaram a jejuar apenas após exibirem sinais de declínio ainda colheram benefícios cognitivos. Contraste isso com o estudo sobre AVC no qual roedores velhos experienciaram quase nenhum benefício ao jejuar, e uma imagem surge: desde que não estejam tentando combater um evento debilitante, como AVC isquêmico ou trauma, cérebros mais velhos também podem esperar benefícios ao jejuar.
Depressão ?
Há muito tempo a depressão tem sido associada com níveis mais baixos de BDNF como prognóstico da doença, mas apenas recentemente pesquisadores estão avaliando a possibilidade de que BDNF baixo e depressão pode estar causalmente relacionados. E de fato - antidepressivos na prática aumentam a sinalização e a síntese de BDNF no hipocampo (a parte do cérebro na qual a depressão "acontece"). Poderia o jejum ajudar com a depressão ao regular BDNF para cima e promover a neurogênese ? Talvez. Eu diria que vale a pena tentar, especialmente porque pular algumas refeições não exige prescrição.
Obviamente, uma vez que esses estudos são na maioria feitos com roedores, e evidência dos efeitos neuroprotetores em humanos, revisada com rigor por pares, não existe ainda, estamos apenas especulando. Mas eu argumentaria que há especulações plausíveis que valem a pena ser perseguidos. Os mecanismos estão lá. Especulações sobre os outros efeitos de IF sobre a saúde – de saúde geral a câncer, longevidade e perda de peso – estão sendo confirmadas por pesquisas em humanos. Ambos os riscos e a barreira de entrda são baixos. E faz sentido à luz da nossa história evolucionária como caçadores-coletores. Em uma entrevista recente, Mattson até mesmo fala sobre os efeitos neuroprotetores de jejuar em termos evolucionários, notando que durante os tempos pré-agriculturais de escassez, as pessoas "cujos cérebros respondiam melhor - que lembravam-se onde fontes promissórias de comida poderiam ser encontradas ou como evitar predadores - teriam sido aqueles que conseguiam a comida" e viviam para passar seus genes adiante.
Enquanto eu envelhoço, o risco de meu cérebro unicamente humano estragar e sabotar meus desejos egoistas de remanecer lúcido e engajado com a vida até o fim, aumenta. Não é uma conclusão precipitada - eu conheço muitas pessoas de mente ágil e língua afiada, 30 anos mais velhos que eu - mas as chances aumentam. Uma vez que eu não quero que isso aconteça, e que jejum ocasional é uma empreitada praticamente livre de risco com benefícios provados em outras áreas, eu vou continuar pular umas poucas refeições de vez em quando. Não me fez mal ainda, pode ser um daqueles fatores que me permitirão viver muito e cair morto, e como sou adaptado a gordura, nem sequer é uma luta conseguir fazer.
Obviamente, uma vez que esses estudos são na maioria feitos com roedores, e evidência dos efeitos neuroprotetores em humanos, revisada com rigor por pares, não existe ainda, estamos apenas especulando. Mas eu argumentaria que há especulações plausíveis que valem a pena ser perseguidos. Os mecanismos estão lá. Especulações sobre os outros efeitos de IF sobre a saúde – de saúde geral a câncer, longevidade e perda de peso – estão sendo confirmadas por pesquisas em humanos. Ambos os riscos e a barreira de entrda são baixos. E faz sentido à luz da nossa história evolucionária como caçadores-coletores. Em uma entrevista recente, Mattson até mesmo fala sobre os efeitos neuroprotetores de jejuar em termos evolucionários, notando que durante os tempos pré-agriculturais de escassez, as pessoas "cujos cérebros respondiam melhor - que lembravam-se onde fontes promissórias de comida poderiam ser encontradas ou como evitar predadores - teriam sido aqueles que conseguiam a comida" e viviam para passar seus genes adiante.
Enquanto eu envelhoço, o risco de meu cérebro unicamente humano estragar e sabotar meus desejos egoistas de remanecer lúcido e engajado com a vida até o fim, aumenta. Não é uma conclusão precipitada - eu conheço muitas pessoas de mente ágil e língua afiada, 30 anos mais velhos que eu - mas as chances aumentam. Uma vez que eu não quero que isso aconteça, e que jejum ocasional é uma empreitada praticamente livre de risco com benefícios provados em outras áreas, eu vou continuar pular umas poucas refeições de vez em quando. Não me fez mal ainda, pode ser um daqueles fatores que me permitirão viver muito e cair morto, e como sou adaptado a gordura, nem sequer é uma luta conseguir fazer.
excelente essa saga hilton, parabéns! estou torcendo para a postagem de mais coisas relacionadas!
ResponderExcluirHilton: Um esclarecimento. Qual seria o melhor jejum, dentre todos estes que você fala?
ResponderExcluir24, 36 ou 48 horas.
Por que, a meu ver, comer dia sim dia não, transforma seu jejum em jejum de 48 horas, e não de 24! Estou correto?
Olá, Tiago
Excluir"Melhor" é uma palavra que não se aplica, a meu ver... Cada pessoa é diferente. Tenho visto, por exemplo, que para mulheres o JI pode não ser interessante.
Sobre o dia-sim-dia-não, quer dizer: durante 24 você come à vontade. Nas próximas 24h, você não come nada...
Confesso que só fiz jejuns de 24h poucas vezes. A pressão que senti foi mais psicológica que física. Algum dia tento as 48h :-D
Ficou mais claro agora. Porque estava entendendo assim: Se fiz a última refeição, ontem, ao meio-dia, e fico sem comer até o meio-dia de hoje, fiz jejum de 24 horas. Agora, comi ontem, meio-dia, pulo a refeição de hoje (dia sim dia não), e volto a comer somente amanhã, fiz, na verdade, jejum de 48 horas.
ExcluirOi Hilton. A parte da Depressão me deixou um pouco confusa. Eu conheço 4 (quatro) pessoas em depressão profunda, seguindo tratamento multidisciplinar,bla bla bla. Um homem e 3 mulheres. Eles são magéeeeeeeeeeeerimos, vivem acamados, se isolam apesar de todos os tratamentos. Se fizerem JI virarão pelo avesso ou morrerão. Comer para eles é uma obrigação, não importa o carinho que os familiares lhes dediquem. Então não vejo como JI poderia auxiliar num quadro de depressão crônica. Sei que é um estudo e creio que não conclusivo. Pelo menos esses quatro sem saber já fazem JI naturalmente, apenas bebendo agua.
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