SOP e Amenorreia Hipotalâmica: O que há de errado com o entendimento contemporâneo e como as mulheres podem tê-la
Artigo traduzido por Juliana Whately. O original está aqui.
por Stefani Ruper
A SOP é complicada. É um
diagnóstico fácil, mas as causas dela raramente são compreendidas. Isso porque
os cistos surgem por uma ampla variedade de circunstâncias hormonais.
Poderíamos
pensar que isso significa que a comunidade médica reconhece a necessidade de
tratamentos diversos entre as pacientes com SOP, mas na verdade não. Em vez de
considerar a ampla variedade de necessidades da SOP, muitos médicos
(especialmente aqueles que não são endocrinologistas) usam diagnósticos e
tratamentos comuns para todas as suas pacientes com SOP. Isto não é totalmente
irracional. Existe uma condição de SOP mais comum, e a bioquímica desta condição
é simples e convincente. No entanto, continuam a existir outros problemas e
causas. A falha em resolvê-los significa que milhares de mulheres acabam não
conseguindo tratamento.
O entendimento atual da SOP é
falho de duas maneiras principais. Em primeiro lugar é o que acabei de
descrever acima, o fato de que uma vasta gama de diferentes problemas hormonais
que podem causar SOP não tem sido realmente explorada ou enfatizada. Em vez
disso, a SOP é amplamente considerada como um efeito direto de ser resistente à
insulina e estar com excesso de peso. Entretanto, isso representa apenas entre
60-80% das pacientes com SOP. A segunda falha é um resultado da visão
limitada: a maioria dos membros da comunidade médica (embora haja um debate
real surgindo) acredita que é impossível tratar a SOP e a amenorreia
hipotalâmica ao mesmo tempo.
Eu discordo.
A crença no problema número dois,
ou seja, que amenorréia e SOP são incompatíveis, deriva do primeiro problema,
ou seja – a falta de uma compreensão das modulações da SOP. A SOP é amplamente
considerada como um problema de resistência à insulina e excesso de peso. Estes
são dois fatores significativos que geram cistos nos ovários. Mas eles não são
os únicos. Apenas 60% das pacientes com SOP têm excesso de peso. Algumas
pacientes com SOP normais no peso também são resistentes à insulina. No
entanto, outras ainda não. O que faz com que mulheres com peso normal
desenvolvam ovários policísticos? E as mulheres sensíveis à insulina?
As recomendações para curar a SOP
são direcionadas à resistência à insulina. Pacientes com SOP são aconselhadas
pelo Instituto Nacional de Saúde para "diminuir 5% do seu peso
corporal", a fim de tornarem-se férteis. Novamente, isto é excelente para
a maioria das pacientes com SOP, que normalmente vão bem e recuperam a função
reprodutiva com a simples implementação de um estilo de vida sensível à
insulina. É por isso que a dieta paleo ganha disparado para as mulheres com
excesso de peso com SOP. Quando se exercitam, comem dietas low-carb e eliminam
alimentos refinados... essas mulheres corrigem sua resistência à insulina,
reduzem sua carga de testosterona e veem seu equilíbrio hormonal voltar
elegantemente para a linha. É interessante notar que há diferentes nuances dentro desta
população – que algumas delas têm níveis vastamente diferentes de estrogênio e
progesterona e diversos graus de desequilíbrio hormonal. Esta é outra razão
pela qual é necessária uma compreensão modulada da SOP para a saúde de cada
mulher. Apesar disso, no entanto, pacientes com SOP obesas geralmente se
recuperam bem com a perda de peso e programas de sensibilização à insulina.
Só que isso realmente não
adianta, entretanto, para o resto das mulheres com SOP.
Abaixo eu discuto algumas das causas típicas e atípicas da SOP, sobre as
quais espero lançar luz em relação à (a) variedade de maneiras em que os hormônios
podem ser desregulados, mas também, em particular, (b) como a amenorréia hipotalâmica
(e hipotireoidismo) pode desempenhar um papel poderoso em causar ovários policísticos.
Há três características necessárias para o diagnóstico de SOP em qualquer
mulher:
- Ovários policísticos, detectados por meio de ultrassom
- Níveis elevados de androgênio (hormônio sexual masculino)
- Menstruação irregular ou ausente
O excesso de peso e a resistência
à insulina são dois aspectos importantes que podem revelar essas
características, mas outras formas são igualmente poderosas. O negócio é – ter
ovários policísticos significa que o processo da menstruação não está 100%. Isso não significa necessariamente que algo sistêmico (tal como a
resistência à insulina) está errado. Em vez disso, significa que em algum
ponto ao longo da cadeia das quatro semanas menstruais, um ou mais fatores de ignição
estão falhos. Um sinal é perdido, um hormônio sobrepõe-se ao resto deles ou um
hormônio não está sendo devidamente produzido, por exemplo. Os andrógenos
geralmente acabam por dominar a cena e os cistos geralmente se desenvolvem. Mas
os mecanismos pelos quais isso acontece não são tão simples como muitos
praticantes da SOP gostariam de nos fazer acreditar.
A via dominante pela qual as mulheres desenvolvem ovários policísticos
é, mais uma vez, a da mulher acima do peso. É um processo bem simples:
- a insulina estimula a produção de testosterona nos ovários, e
- a produção de testosterona desregula os níveis de estrogênio e inibe a sinalização estrogênica.
Na SOP, a testosterona e o
estrogênio ficam mal-equilibrados e o restante do ciclo menstrual, que segue o
aumento e a queda dos níveis de estrogênio, sofre. LH e FSH, dois hormônios
hipofisários que informam aos ovários o que fazer e quando, são particularmente
preocupantes. Ambos tornam-se desregulados com o estrogênio desregulado porque
eles funcionam de acordo com as concentrações de estrogênio no sangue. É por
isso que a maioria das pacientes com SOP têm uma elevada e invertida relação
entre LH e FSH em comparação com mulheres saudáveis. A glândula pituitária
continua tentando fazer o corpo ovular, mas ele não lê os sinais de estrogênio
corretamente, e os ovários não ouvem a hipófise corretamente. Então esses são os marcadores de um diagnóstico
típico de SOP: LH e FSH invertido, resistência à insulina, excesso de peso e
níveis elevados de testosterona.
No entanto, existem outros meios
pelos quais o perfil hormonal da mulher pode criar cistos.
O primeiro é um caso simples e felizmente é reconhecido por muitos na
comunidade médica: o de hipotireoidismo. Ter baixo T3 (a forma ativa do
hormônio da tireóide) no sangue está fortemente correlacionada com ovários policísticos.
Quando as mulheres com hipotireoidismo subclínico corrigem a sua condição (o
que normalmente é feito em estudos médicos tomando pílulas de T3), a maioria das
mulheres começa a menstruar novamente. Isto é, presumivelmente, porque baixos
níveis de T3 diminuem a atividade das células e a sinalização hormonal, o que
significa que o ciclo menstrual prossegue de forma intermitente, em vez de contínuo,
com saúde global. Três causas comuns da
baixa função da tireóide são pouco sono, ingestão calórica restrita e uma dieta
com restrição de carboidratos em longo prazo (já que a glicose é necessária
para a conversão de T4 para T3 no fígado).
O segundo é o caso importante e poderoso da amenorreia hipotalâmica (AH).
AH é muito conhecida por ser exatamente o oposto da SOP. Na SOP, os níveis
hormonais muitas vezes sobem rapidamente. Alta de testosterona, LH alto e
desigual para FSH, altos níveis de estrógeno (embora nem sempre). Na AH, os
níveis hormonais despencam. Baixa de LH, FSH baixo, baixa de estrogênio, baixos
níveis de testosterona. A SOP é um problema de excesso de peso; a AH é um
problema de estar abaixo do peso. Na SOP, as mulheres sobreproduzem hormônios.
Em AH, as mulheres subproduzem hormônios.
E assim a história continua. No
entanto, as mulheres podem apresentar ovários policísticos e ainda terem baixos
níveis de hormônios. O problema – o
problema real, verdadeiramente universal, que cria cistos – é um desequilíbrio hormonal. Níveis
absolutos dos hormônios são importantes, mas ainda mais importante é o
equilíbrio entre a testosterona, o estrogênio, a progesterona e até a leptina.
Os outros fatores – resistência à insulina, inversão do LH e FSH e excesso de
peso – não são a única coisa que pode criar um perfil cístico
andrógeno-dominante.
A amenorreia hipotalâmica é um problema de ser muito estressado, comer
muito poucas calorias, exercício demais e ter muito pouca gordura corporal. Na
essência, é uma condição causada pelo estresse do hipotálamo e subrregulação. Daí
o nome.
As maneiras pelas quais esses
quatro problemas, geralmente classificados em um diagnóstico de amenorreia
hipotalâmica, – a alimentação, o exercício, o estresse e a gordura corporal –
podem causar cistos e/ou co-ocorrerem com sintomas da SOP mais clássicos são
vastas. Aqui estão alguns exemplos:
- A mulher está realmente estressada pelo trabalho e pela vida. Enquanto a maioria da sua produção de hormônios cai, sua produção de DHEA-S (o hormônio topo-da-cadeia-alimentar produzido pela glândula adrenal) dispara em resposta à desregulação do eixo HPA (hipotalâmico-ptuitário-adrenal). O DHEA-S é um andrógeno e isso influencia o desenvolvimento dos ovários policísticos se os níveis de estrogênio não estão tão altos.
- A mulher é bastante saudável, mas dormiu mal durante toda a sua vida. Isso a leva à resistência à insulina, mas mais do que isso, desregula e aumenta sua produção de cortisol. O cortisol sinaliza ao eixo HPA para diminuir a atividade da hipófise e ele o faz. Todos os seus níveis hormonais diminuem. A predisposição dessa mulher à resistência à insulina juntamente com flutuações adrenais-induzidas desencadeia o desenvolvimento de cistos ovarianos.
- A mulher está estressada via típicos caminhos de AH – restrição calórica, excesso de exercício e estresse – então seus hormônios hipofisários diminuem em potência. Os níveis de testosterona e estrogênio estão baixos, mas tudo bem, e a mulher provavelmente é magra, mas também pode ser gorda, dependendo do grau de estresse. No entanto, desta vez, é a progesterona que leva ao maior aumento do estresse (levando a deixa do estrogênio e do LH), e a menstruação pode nunca acontecer sem os níveis de progesterona suficientes.
- A mulher tem uma tendência para a resistência à insulina e tem excesso de peso e, em seguida, perde peso. Enquanto isso, corrige o problema de insulina, e a queda nos níveis de estrogênio que tem a partir da perda de peso (uma vez que o estrogênio é produzido em células de gordura) provoca um desequilíbrio em seus ovários-predispostos-à-produção-de-testosterona.
- Ou um fenômeno semelhante ocorre com a leptina: Neste caso, uma mulher pode ser um pouco resistente à insulina e, portanto, têm uma predisposição para a produção de testosterona, mas ela não testa em uma zona de “perigo” da testosterona. Em vez disso, seu problema está no fato de que ela perdeu peso e, com isso, perdeu a potência de suas reservas de leptina. Durante a puberdade, o corpo de cada mulher se adapta a quaisquer níveis de estrogênio e leptina circulante em seu sangue no momento (e criam um certo "set point" de leptina). Mais tarde na vida, uma destas mulheres perde peso. Como ela perde peso e, significativamente, se ela está restringindo calorias ou praticando exercício excessivamente, seus níveis de leptina (e estrogênio) caem. O hipotálamo percebe essa queda como uma indicação de um período de fome e inicia uma resposta de fome, principalmente através da diminuição da produção de hormônios sexuais. No caso desta mulher, por conseguinte, o estrogênio está baixo e a testosterona pode estar baixa ou alta, dependendo do grau de resistência à insulina e do mau-funcionamento do ovário, mas LH e FSH estão ambos baixos. Ela não apresenta uma SOP típica. Ela não tem excesso de produção de hormônios, mas tem, em vez disso, subprodução.
Tudo isso dito, estes são alguns
exemplos de como os problemas típicos de AH podem causar a doença cística que é
tipicamente associada unicamente com SOP. Estresse, excesso de exercício,
ingestão restrita de macronutrientes, calorias restritas e variação de peso
podem contribuir para o desenvolvimento de cistos. Muitas destas situações
podem co-ocorrer e dependem totalmente da genética, epigenética, estilo de vida
e dieta da mulher.
O problema de ter um entendimento pobre da SOP está na maneira em que
as recomendações são feitas para mulheres com SOP ou AH. Como resultado
dessa mentalidade, tenho sido criticada por recomendar que mulheres magras com
SOP comam carboidratos. Isso ocorre porque aqueles que estão me criticando acreditam
que a SOP é apenas um resultado de resistência à insulina. Eu não acredito
nisso. Eu acredito que muitas mulheres com SOP não necessariamente têm um problema com a resistência à insulina e, mesmo
que tenham, pode até ser agravada por fatores que estão fora desse diagnóstico
típico.
Gostaria, então, de recomendar
fortemente que as mulheres que estão acima do peso e resistentes à insulina
sigam o protocolo SOP típico e tomam medidas sensibilizadoras de insulina. Por
outro lado, gostaria de recomendar fortemente que mulheres potencialmente
abaixo do peso e as mulheres excessivamente estressadas com SOP considerem
comer mais, possivelmente aumentando a sua ingestão de carboidratos e se
exercitarem menos. As mulheres com hipotiroidismo fariam bem em corrigir esse
problema se assim entenderem. Isto é, no entanto, particular para o indivíduo, então por favor não tomem minhas
reflexões sobre a etiologia e tratamento da SOP como prescrições. Jamais.
A recomendação real, portanto, é fazer um exame de
sangue (!) e discutir com o seu médico sobre todas as possibilidades que
poderiam estar afetando seus níveis hormonais. Com a SOP é crucial solicitar
exames de sangue. Embora seja quase uma certeza de que os níveis de androgênio estão
elevados em relação ao resto dos hormônios, não é o caso 100% do
tempo. Todos os níveis hormonais – testosterona, estrogênio, progesterona, LH,
FSH, e T3 podem estar nomais e ainda levar uma mulher a apresentar SOP. Uma
imagem adequada do que está acontecendo no corpo é crucial para avançar. Isso,
então, permite que as mulheres realizem mudanças na dieta e estilo de vida
adequadas para a sua própria saúde como um todo e suas necessidades de bem-estar.
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