Cetose nutricional x Cetoacidose
Artigo traduzido por Hilton Sousa. O original está aqui.
Este assunto é na prática muito mais simples do que se pensa, sendo simplesmente uma questão da quantidade de corpos cetônicos produzidos - e só é problema em indivíduos incapazes de produzir insulina.
Infelizmente, isso é geralmente ignorado mesmo em textos médicos, de maneira que não é incomum mesmo para médicos e enfermeiras entenderem errado a diferença simples e no entanto crucial - para não mencionar os nutricionistas.
No fim das contas, é tudo uma questão de volume. Mais ou menos como a diferença entre uma "provadinha", um gole e afogamento.
Uma dieta moderada em carboidratos vai frequentemente resultar em traços ocasionais de corpos cetônicos no sangue, tipicamente após um jejum ou após uma sessão decente de exercícios. Uma dieta muito pobre em carboidratos é cetogênica por natureza devido tanto aos baixos níveis de carboidrato em circulação/armazenado quanto à alta ingestão de gorduras, e vai resultar em níveis moderados de corpos cetônicos circulando, usualmente em concentrações que vão de 1/4 a 1/2 da de glicose, mas ocasionalmente alcançando ou mesmo excedendo a paridade.
A fome propriamente dita – ausência de ingestão calórica por uma ou duas semanas – pode resultar em concentrações de corpos cetônicos duas ou três vezes maiores que a de glicose, mas ainda que o corpo tenha mecanismos de resposta suficientes para manter níveis de cetonas que ainda estão dentro dos parâmetros seguros, você vai ter danos aos órgãos causados por outros estressores antes que as cetonas tornem-se um problema. Existe é claro algo chamado "cetoacidose alcoólica", mas esta requer períodos extensos de tempo nos quais perto de 100% das suas calorias são derivadas do etanol.
O ponto é: não há nada de errado com a cetose nutricional. Se você for capaz de produzir insulina então não há risco de acidose, que na prática são níveis ridiculamente altos de cetonas E de glicose.
Os níveis de corpos cetônicos séricos tipicamente tem essa aparência:
- Dieta normal: 0 a 1.8mg/dl
- Dieta normal, jejum durante a noite: 1.8 a 9mg/dl
- Dieta cetogênica: 10,8 a 54mg/dl
- 1 a 4 semanas de fome: 54 a 180mg/dl
- Insuficiência de insulina por diabetes: > 360mg/dl
Citação extraída daqui:
Cetose ocorre em um número de estados fisiológicos incluindo jejum (chamada de "cetose por fome"), o consumo de uma dieta rica em gordura (chamada "cetose dietária"), e imediatamente após exercício (chamada "cetose pós-exercício"). Dois estados metabólicos patológicos e potencialmente fatais durante os quais a cetose ocorre são a cetoacidose diabética e a cetoacidose alcoólica.
A maior diferença entre a por fome, a dietária e as cetoacidoses está no nível de concentração de cetonas visto no sangue. Cetose por fome e dietária normalmente não vai progredir para níveis perigosos, devido a vários mecanismos de resposta presentes no corpo. As cetoacidoses diabéticas e alcoólicas são ambas condições potencialmente fatais.
Sob condições normais, os corpos cetônicos estão presentes na corrente sanguínea em quantidades diminutas, aproximadamente 1,8mg/dl. Quando a formação de corpos cetônicos aumenta no fígado, as cetonas começam a se acumular na corrente sanguínea. Cetose é definida clinicamente como uma concentração de cetonas acima de 3,6mg/dl. Cetose leve, por volta de 36mg/dl, também ocorre após exercício aeróbico. Cetoacidose é definida como sendo qualquer concentração de cetonas acima de 126mg/dl. Cetoacidose diabética e alcoólica resulta em concentrações de cetonas de até 450mg/dl. Este nível de cetose nunca vai ocorrer em indivíduos não-diabéticos ou não-alcoólatras.
Adicionalmente, em indivíduos não-diabéticos há pelo menos dois mecanismos de resposta que evitam a ocorrência da cetoacidose descontrolada. Quando as cetonas alcançam altas concentrações no sangue (aproximadamente 72-108mg/dl), elas estimulam a liberação de insulina. Este aumento na insulina tem 3 grandes efeitos. Primeiro, retarda a liberação de ácidos graxos livres (FFA) das células de gordura. Segundo, ao elevar a proporção insulina/glucagon, a taxa de formação de corpos cetônicos no fígado é diminuída. Terceiro, ela aumenta a excreção de cetonas na urina. Estes 3 efeitos todos servem para baixar a concentração de corpos cetônicos no sangue.
Além de estimular a liberação de insulina, as cetonas parecem ter um impacto direto na célula de gordura, diminuindo a liberação de FFA. Isso serviria para limitar os FFA disponíveis para o fígado, dimuindo a formação de corpos cetônicos. Em última análise, estes mecanismos de resposta evitam que o indivíduo não-diabético produza cetonas excessivamente, uma vez que altos níveis de cetonas diminuem a formação de corpos cetônicos.
Citação extraída daqui.
Cetose nutricional é uma resposta fisiológica normal à restrição de energia e carboidratos. Uma dieta cetogênica é uma estratégia efetiva de perda de peso para muitos. A cetoacidose, por outro lado, é uma condição patológica causada pela deficiência de insulina. O tema comum é a baixa insulina; entretanto, na cetoacidose, os níveis de glicose sanguínea são muito altos. Os níveis de cetonas são elevados em ambos os estados, apesar de serem 10 a 20 vezes mais altos na cetoacidose (~9-36mg/dl vs. > 360mg/dl). Cetose nutricional e cetoacidose não devem ser confundidas, e uma dieta cetogênica não causa cetoacidose (...)
Em pessoas numa dieta cetogênica, os níveis de glicose sanguíneos não ficam aumentados. Este é um aspecto importante que diferencia a cetose nutricional da cetoacidose (...)
Dieta cetogênica é segura, e pode ser benéfica. Cetoacidose é patológica em pode ser fatal.Citação extraída daqui.
Efeitos metabólicos das dietas muito pobres em carboidratos: "vilões" incompreendidos do metabolismo humano (...)
Cetoacidose diabética x Cetose dietária
Pacientes diabéticos sabem que a detecção de corpos cetônicos em sua urina é um sinal de perigo de que sua diabetes está mal-controlada. De fato, em diabetes severamente sem controle, se os corpos cetônicos forem produzidos em quantidades supranormais, eles estão associados com a cetoacidose.
Entretanto, durante a ingestão muito baixa de carboidratos, a produção regulada e controlada de corpos cetônicos causa um estado fisiológico inofensivo chamado cetose dietária.
Citação extraída daqui.
A cetose é perigosa ? (...)
Você pode ter ouvido do seu médico que cetose é uma condição que ameaça a vida. Se sim, seu médito está confundindo cetoacidose diabética (DKA) com cetose nutricional (...)
O que é a cetoacidose diabética ? Quando um diabético (geralmente um diabético tipo 1, mas às vezes isso acontece na diabetes tipo 2 avançada, insulinodependente) falha em receber insulina suficinete, eles entram em um estado efetivo de fome (N.T.: o original "starvation" refere-se mais a "definhar de fome", mas vou usar "fome" mesmo :-). Ainda que possam ter toda a glicose do mundo em sua corrente sanguínea, sem a insulina ela não consegue entrar nas células. Então, eles efetivamente entram em estado de fome.
O corpo faz o que faria em qualquer pessoa – começa a produzir cetonas a partir de gordura e proteínas. Aqui está o problema: o paciente diabético neste caso não consegue produzir qualquer insulina, então não há mecanismo de resposta e ele continua a produzir mais e mais cetonas sem parar. Quando os níveis de cetonas (especificamente, de beta-hidroxibutirato) aproximam-se dos 270-450mg/dl, o desequilíbrio do pH resultante leva a desarranjos metabólicos profundos e o paciente fica criticamente doente.
Mas este estado de desarranjo metabólico não é possível na prática em uma pessoa que pode produzir insulina, mesmo em quantidades pequenas.
A razão para isso é que um mecanismo de resposta impede o nível de cetonas de ficar alto o suficiente para causar a mudança no pH que leva à cascata de problemas. Uma pessoa que é dita "cetoadaptada", ou em um estado de cetose nutricional, geralmente tem níveis de beta-hidroxibutirato entre 9 e 54mg/dl. Isso é muito menos que os níveis requeridos para causar dano através de anormalidades ácido-básicas.
- Sem a insulina do pâncreas, a glicose dos alimentos é incapaz de ser processada pelo corpo.
- O fígado produz mais glicose para alimentar o corpo, mas sem a insulina, a glicose acumula-se na corrente sanguínea.
- Sem a glicose como fonte de energia, o corpo quebra a gordura. Cetonas (ácidos tóxicos) são um subproduto do metabolismo de gordura e acumulam-se na corrente sanguínea (cetoacidose). Isso pode ser fatal, causando anomalias no ritmo cardíaco.
- Cetonas e glicose são transferidas para a urina.
- Os rins utilizam água para tirar o excesso de cetonas e glicose da corrente sanguínea.
- A água é perdida junto com o excesso de glicose e cetonas. A perda de água leva à desidratação, que piora a cetoacidose em um ciclo vicioso e causa baixa pressão arterial e choque.
Citação extraída daqui.
Cetoacidose x Cetose
Então qual é a diferença distintiva entre as duas ? Ambas são condições de altos níveis de corpos cetônicos no sangue, mas uma ameaça a vida e outra não. Então por que isso é assim ?
Nota:
- Corpos cetônicos no sangue é chamado cetose. Corpos cetônicos na urina, que é a maneira mais comum de medi-los, é chamado cetonúria.
- Corpos cetônicos são ácidos.
- O sangue contém diversos ácidos: fosfórico, carbônico, e estes são neutralizados pela soma de ácidos e bases.
- Se os níveis de ácido excederem certo ponto, isso é chamado acidose.
- Como os corpos cetônicos também são ácidos, eles poderiam contribuir para uma acidose em níveis muito altos. A isso nos referimos como cetoacidose, e como qualquer acidose, é perigosa.
- Qualquer cetose pode ser considerada "alta' porque o homem moderno raramente fica em estado de jejum prolongado.
- Cetose é a resposta normal à falta de alimento ou restrição de carboidratos.
- A cetose resultante da falta de alimento ou restrição de carboidratos é regulada por hormônios e outros efeitos metabólicos para evitar a superprodução – ou seja, evitar a cetoacidose.
- Se a regulação deteriora-se por alguma razão, notadamente diabetes tipo 1 sem tratamento (a insulina é um dos grandes reguladores da produção de corpos cetônicos), então você pode ter superprodução ou cetoacidose.
- Corpos cetônicos são normais porque não ter comida o tempo inteiro era normal. É por isso que chamamos os corpos cetônicos de "comida dos nossos ancestrais".
- Os corpos cetônicos são o acetoacetato e o beta-hidroxibutirato. Estes são os corpos cetônicos fisiológicos. Acetona pode ser produzida não-enzimaticamente, e também é considerada um corpo cetônico.
- O termo "cetona" é comumente usado em discussões ao invés do termo mais preciso "corpos cetônicos". Químicos orgânicos, professores rígidos e outros acham que é uma boa idéia ser preciso porque cetona é um tipo de composto específico (acetona é um deles) dos quais há um número infinito e, curiosamente, um dos corpos cetônicos (beta-hidroxibutirato) não é uma cetona na prática. O outro, acetoacetato é quimicamente tanto uma cetona quanto um ácido.
Citação extraída daqui.
Cetose – um estado vantajoso ou incompreendido ? (Parte I)
(...)
Uma outra questão de ordem: Cetose x Cetoacidose (DKA) ?
(...)
DKA é um estado patológico (ou seja, danoso) que resulta da ausência completa ou quase completa de insulina.
Isso ocorre na diabetes tipo 1 ou no estágio final da tipo 2, e frequentemente como o resultado de insulto fisiológico (por exemplo, uma infecção) no qual o paciente não está recebendo insulina suficiente para internalizar a glicose em suas células.
Uma pessoa com um pâncreas normal, independente do quanto jejue (...) ou do quanto restrinja seus carboidratos, não pode entrar em DKA porque ainda assim um traço de insulina vai manter os níveis de B-OHB abaixo de 130 ou 160mg/dl – bem abaixo do limiar para desenvolver as anormalidades ácido-base, patológicas, associadas com DKA.
Deixe-me reiterar: é fisiologicamente impossível induzir DKA em qualquer um que não tenha diabetes tipo 1 ou diabetes tipo 2 com exaustão pancreática muito, muito, muito avançada.
Citação extraída daqui;
Cetoacidose e Cetose
Cetoacidose ou Cetose: em meados do século XX, "cetose" referia-se à situação na qual o corpo tinha quantidades anormais dos "corpos acetônicos", tais como ácido beta-hidroxibutírico, ácido acetoacético e acetona (página 246, Livro-texto de Bioquímica, 8a edição, Benjamin Harrow, PhD & Abraham Mazur, PhD)
Naquela época, provavelmente achávamos que a diabetes mellitus era a única condição na qual o corpo tinha uma quantidade anormal de corpos cetônicos, produzidos principalmente pelo fígado e rins. Como a insulina não funciona apropriadamente na diabetes mellitus, tanto hiperinsulinemia ou oligoinsulinemia, o corpo não consegue usar o excesso de cetonas ou corpos cetônicos e torna-se acidótico.
Mais tarde, descobrimos que a cetose também acontece em situações como a fome, à qual nos referimos como "cetose fisiológica da fome" (página 722, Livro-texto de Bioquímica, 5a. Edição, Thomas M. Devlin, Editor). Na fome, a insulina funciona e o ácido beta-hidroxibutírico ou o betahidroxibutirato são usados para produzir energia, o sujeito não tem muita acidose – se é que tem alguma.
Naquela época, aparentemente não sabíamos muito a respeito da restrição de carboidratos sem fome também poder produzir cetose. Durante anos recentes, nos referimos à cetose (sem acidose) nas situações tais como fome e restrição de carboidratos, nas quais o corpo produz corpos cetônicos, principalmente beta-hidroxibutirato, sem acidose. Curiosamente, se ingerirmos bastantes ácidos graxos de cadeia média tais como aqueles no óleo de coco, podemos obter muito beta-hidroxibutirato sem acidose.
Citação extraída daqui.
Além da perda de peso: uma revisão dos usos terapêuticos de dietas muito pobres em carboidratos (cetogênicas).
(...)
Gostaríamos de enfatizar que a cetose é um mecanismo completamente fisiológico e que foi o bioquímico Hans Krebs quem primeiro se referiu à cetose fisiológica para diferenciá-la da cetoacidose patológica vista na diabetes tipo 1.
Na cetose fisiológica (que ocorre durante dietas cetogênicas com muito pouco carboidrato), a cetonemia atinge níveis máximos de 130/160mg/dl (não vai mais alto que isso precisamente porque o sistema nervoso central usa eficientemente tais moléculas como fonte de energia, ao invés de glicose) e sem alteração no pH, enquanto na cetoacidose diabética descontrolada ela pode exceder 360mg/dl com concomitante diminuição do pH sanguíneo.
Níveis sanguíneos Dieta normal Dieta cetogênica Cetoacidose diabética Glicose (mg/dl) 80-120 65-80 >300 Insulin (U/l) 6-23 6.6-9.4 ~0 Concentração de corpos
cetônicos (mg/dl)1.8 126-144 > 450 pH 7.4 7.4 > 7.3
Citação extraída daqui.
Metabolismo de combustível durante a fome
(...)
Minha experiência como estagiário (1953) tratando um jovem em cetoacidose diabética evidenciou a nossa ignorância dos controles no metabolismo humano de combustível.
Ácidos graxos livres em circulação eram desconhecidos na época, a insulina não podia ser medida em fluidos biológicos, e o ácido beta-hidroxibutírico, que era difícil de medir, era considerado por muitos um veneno metabólico.
O papel central da insulina e o metabolismo de ácidos graxos livres, glicerol, lactato e piruvato, combinados com a calorimetria indireta, precisava ser caracterizada em um estado quase constante, a fome prolongada.
Citação extraída daqui.
Cetose é o mesmo que cetoacidose ?
Há frequentemente confusão sobre a diferença entre cetose e cetoacidose.
Cetose é o estado através do qual o corpo produz cetonas. Na cetose, o nível de cetonas no sangue pode ser algo entre normal e muito alto.
A cetoacidose diabética, também conhecida como DKA, só descreve o estado no qual o nível de cetonas está alto ou muito alto. Na cetoacidose, a quantidade de cetonas no sangue é suficiente para torná-lo ácido, o que é um estado médico perigoso.
Citação extraída daqui.
Mais comumente, cetoacidose é cetoacidose diabética (DKA), que resulta do metabolismo aumentado de gorduras devido a uma falta de insulina.
Citação extraída daqui.
Medo da cetose
Médicos tem sido há muito ensinados a temer a cetose; a marca registrada da potencialmente fatal cetoacidose diabética, na qual deficiência insulínica severa faz com que ácidos graxos livres saiam em grande quantidade do tecido adiposo e sejam convertidos pelo fígado em corpos cetônicos, beta-hidroxibutirato e acetoacetato.
Nesta condição, os corpos cetônicos podem alcançar os 450mg/dl no sangue, fazendo com que o bicarbonato sanguíneo caia para quase zero, com acidose severa resultante. Isso e a hipovolemia concomitante, devido à perda urinária de água pela hiperglicemia e glicosuria, somados à perda de sódio e potássio pela cetonúria, resulta em morte se não tratado.
Este medo da cetose pode ser exagerado. Cetose leve pode ter potencial terapêutico em uma variedade de estados de doenças. Corpos cetônicos chegam a 90-130mg/dl no humano em jejum, e são essenciais para preservar massa muscular de ser convertida em glicose para consumo do cérebro.
Citação extraída daqui.
Correlação entre cetonas na urina (acetoacetato) e cetonas em sangue capilar (beta-hidroxibutirato) em pacientes hiperglicêmicos.
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Para facilitar a transição de cetonas da urina para cetonas de sangue capilar, estudamos a correlação entre estes dois testes.
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Em pacientes hiperglicêmicos do Depataramento de Emergências, uma boa correlação foi observada entre cetonas da urina e cetonas de sangue capilar para baixos valores, mas uma correlação ruim foi observada para altos valores. Cada um dos tests pode então ser usado para excluir a cetose, mas o teste de cetonas de sangue capilar é mais preciso para confirmar cetoacidose.
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