3 razões pelas quais você deveria ser cético quanto às novas diretrizes sobre colesterol

Artigo traduzido por Hilton Sousa. O original está aqui.


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Tenho certeza que por agora, você já ouviu que as principais organizações sobre saúde cardíaca nos EUA publicaram diretrizes atualizadas de tratamento com drogas redutoras de colesterol (estatinas). As mudanças incluem o descarte de números que vem sendo usado para monitorar tratamento por décadas, e a recomendação de estatinas para qualquer pessoa com risco de infarto ou derrame maior que 7.5% em 10 anos, conforme determinado por um novo calculador de risco.

As novas diretrizes receberam muita atenção da mídia nos últimos dias, incluindo críticas de ninguém menos que o ex-presidente do Colegiado Americano de Cardiologia.. Eu estou feliz por ver isso, porque como vou argumentar nesse artigo, as novas diretrizes são problemáticas e colocariam milhões em risco devido a tratamentos prolongados e desnecessarios com estatinas.

Aqui vão 3 razões pelas quais você deveria ser cético com as novas diretrizes sobre colesterol e estatinas.

#1: Elas superestimam dramaticamente o risco

Dois professores da Escola de Medicina de Harvard, Dr. Paul M. Ridker e Dra. Nancy Cook, apontaram que o novo calculador de risco superestima entre 75 e 150% o risco real, dependendo da população (1). Por exemplo, um homem cujo risco fosse 4% poderia acabar tendo um risco de 8% - o que o moveria de "nenhum tratamento recomendado" para o grupo "prescreva estatina".

Dr. Steven Nissen, um ex-presidente do Colegiado Americano de Cardiologia, forneceu informações sobre pacientes hipotéticos ao novo calculador para ver o que ele recomendaria. Ele ficou chocado ao descobrir que o calculador mostrou um risco de 7.5% para um homem negro de 60 anos, não fumante, sem fatores de risco, colesterol total 150, HDL 45 e pressão sistólica de 125. Ele também notou que o calculador sugere um risco de 7.5% para um homem branco de 60 anos, sem fatores de risco. "Se usarmos esse novo calculador", disse o Dr. Nissem, "ele colocaria quase todos os homens saudáveis acima dos 60 anos, a serem tratados com estatina, ainda que estejam no grupo de risco mais baixo". (2)

#2: Elas são baseadas em evidências errôneas, incompletas ou obsoletas

Em um excelente artigo do jornal de Procedimentos Clínicos de Mayo, Dr. Allan Sniderman e colegas argumentam que a chamada "medicina baseada em evidências" é problemática por conta das limitações da evidência usada como base das diretrizes e recomendações de tratamento. (3) Como um exemplo, ele aponta o papel das estatinas na prevenção primária (isto é, prescrever estatinas para pessoas saudáveis sem doença cardíaca pré-existente, como uma forma de prevení-la). A maioria dos médicos acredita que as doses de estatinas mais altas são a melhor escolha baseados em uma única meta-análise (uma análise de diversos estudos individuais) que envolveu estudos comparativos de 5 doeses. Entretando, como aponta o Dr. Sniderman, a meta-análise é tem falhas e não suporta a conclusão de doeses mais altas de estatinas são mais efetivas que doses mais baixas na prevenção de doenças cardíacas em pessoas saudáveis.

Outro problema é que as diretrizes de tratamento são frequentemente baseadas em evidências ultrapassadas. Esse é exatamente o caso com o novo calculador de risco, que usa dados de estudos feitos duas décadas atrás para determinar como fatores de risco como colesterol e pressão sanguínea predizem ataques cardíacos e derrames em períodos posteriores da vida. Dados desses estudos não são mais válidos porque os participantes são de outra era com diferentes comportamentos e riscos. Por exemplo, no final dos anos 1990 mais pessoas fumavam e os ataques cardíacos e derrames ocorriam muito mais cedo.

#3: Elas estão sujeitas a conflitos de interesse

Numerosos estudos demonstraram que conflitos de interesse são um problema real na pesquisa científica (4). De acordo com Lisa Cosgrove, professora associada na Universidade de Massachusetts, "quando indivíduos tem laços comerciais eles estão vulneráveis a desenvolver maneiras de pensar sutis, mas às vezes poderosas, pró-indústria" (5). O Dr. David Antonuccio afirmou ainda mais claramente, em seu excelente artigo “Antidepressivos: Um triunfo do marketing sobre a ciência”:

Experts patrocinados por companhias, sejam pesquisadores ou educadores, são por definição empregados das mesmas. Eles serão mantidos apenas se oferecerem tratamento favorável  e consistente aos produtos da companhia.

Isso explica o porque de grupos como o Instituto de Medicina recomendar minimizar ou eliminar conflitos de interesse em grupos de desenvolvimento de diretrizes. Eles escreveram que "sempre que possível, grupos de desenvolvimento de diretrizes não deveriam ter conflitos de interesse... e o diretor ou co-diretores não deveriam ser pessoas com conflitos de interesses" (6)

A Associação Cardíaca Americana e o Colegiado Americano de Cardiologia não seguiram as sensíveis recomendações do Instituto de Medicina quando montaram seu painel de experts. Dos 15 membros que autorizaram as novas diretrizes, 6 reportaram ter ligações recentes ou correntes com companhias farmacêuticas que vendem ou estão desenvolvendo drogas para redução de colesterol. Entre as companhias listadas estão a Merck, Amgen, AstraZeneca, Pfizer, Amarin, Roche e Abbot. (para a lista completa, veja as páginas 51–57 das novas diretrizes)

Ainda mais estranho, tenho visto pessoas criticando a idéia de que conflitos de interesse afetariam as prescrições de estatinas porque a maioria das estatinas não é mais protegida por patentes e portanto não são mais lucrativas para as indústrias farmacêuticas. Nada poderia estar mais longe da verdade. Nos últimos 5 anos, as prescrições de estatinas nos EUA cresceram 20%, chegando a 264 de pessoas por ano (um número chocantemtente alto, para um país com população de 314 milhões). As vendas totais de drogas redutoras de colesterol, incluindo estatinas, foram de 35 bilhões de dólares em 2012. A venda de estatinas chegou aos US$29 bilhões no mundo, e 10 bilhões só nos EUA (7). Essas são quantias enormes. De fato, as vendas de estatinas respondem por aproximadamente 10% de todas as drogas vendidas nos EUA, com uma única estatina (Lipitor) gerando quase 8 bilhões em vendas sozinho (8). Acredito que é bastante apropriado dizer que as companhias farmacêuticas estão fazendo vendas matadoras com as estatinas.

30 anos atrás, o então diretor-executivo da Merck (Harry Gadsen) disse à Revista Fortune que ele queria que a Merck fosse mais parecida com a fabricante de goma de mascar Wrigley's. Tem sido o sonho de Gadsen fazer drogas para pessoas saudáveis, para que a Merck possa "vender para todo mundo" (9). Se implementadas, essas novas diretrizes de colesterol ajudariam a tornar a visão de Gadsen uma realidade.

Felizmente, parece que as diretrizes da maneira com estão formuladas atualmente, não serão aceitas devido a sérias falhas apontadas por cardiologistas de ponta país afora. Nesse meio-tempo, se você está se perguntando o que fazer (ou não fazer) sobre colesterola alto, leia minha série recente chamada O mito da dieta cardíaca.

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