Não me odeie porque sou paleo
Artigo traduzido por Hilton Sousa. O original está aqui.
por Zak Stone
A senhora de óculos na grelha coloca uma linguiça torrada entre as folhas de salada e os condimentos que enchem o meu prato de papel em um churrasco casual de verão.
"Você quer um pão?" ela pergunta. "Eu estou tostando alguns".
Antes que eu tenha a chance de responder, minha amiga Kate responde por mim.
"Não, ele não quer um pão", ela anuncia. "Ele é paleo".
Com essas palavras, é como se eu tivesse entrado na festa e começado a urinar nas plantas da casa. Todos os olhos de repente estão sobre mim.
"Você é paleo?!" alguém pergunta.
"Quanto bacon você come?" pergunta outro. "Os homens das cavernas tomavam leite de amêndoas? Como você consegue viver sem queijo?"
Meus amigos são pessoas de mente aberta que nem piscariam se eu revelasse minhas taras sexuais mais profundas e sombrias. Eles não me julgariam por minha preguiça ou desconsideração pela Mãe Terra – digamos que eu admito que vou de carro à lavanderia que fica a 1 quarteirão de distância. Eles relevariam a minha própria vaidade – e na prática podem até encorajá-la com um "curti" – se eu postasse um selfie sem camisa no Instagram. Eles considerariam seriamente qualquer número de argumentos pseudo-intelectuais sobre a importância do signo de uma possível ficante, a habilidade dos detoxes de suco conseguirem expelir as toxinas do corpo, ou a significância da Kim Kardashian como artista.
Mas desde que eu decidi abraçar a dieta paleo, descobri que a parte mais difícil não é eliminar os laticínios, grãos, leguminosas e açúcar refinado. Ao invés, é o fuzilamento de críticas, questões perplexas e hostilidade pura e simples sempre que as pessoas descobrem, independente das minhas melhores tentativas em evitar proselitizar – ou sequer mencionar.
"Suas amêndoas e maçãs estão me fazendo sentir culpada sobre meus chips", uma ex-colega de trabalho uma vez me disse, enquanto passava pela minha baia em direção à máquina de lanches.
"Eu ouvi dizer que paleo te deixa nervoso", outro amigo alertou, parecendo um pouco preocupado. "E realmente excitado".
"Para mim é nojento pensar em beijar alguém que come tanta carne", minha amiga vegetariana mais chegada confidenciou, enquanto debatia se deveria deixar de transar com um outro amigo depois de descobrir que ele era paleo (acabaram rompendo mesmo, mas por outras razões que não a dieta).
"Você é um deles?" outro amigo exclamou ao descobrir o menu livre de grãos em um jantar que eu ofereci (que também era um jantar vegano).
"Por que?!"
Eu prefiro não discutir. Esses céticos são geralmente bem-versados nas justificativas por trás da dieta paleo depois que uma série de textos populares, livros de auto-ajuda best-sellers e endossos de fanáticos por saúde (Matthew McConaughey) ou por modistas (Jeb Bush) transformaram a paleo na versão dos anos 2010 da dieta Atkins – uma dieta muito comentada, compartilhando ódio ao pão.
De acordo com experts tais como John Durant, autor do "Manifesto Paleo", a dieta é uma tentativa de recriar os alimentos consumidos por nossos ancestrais das cavernas – trocando alimentos processados e grãos por carnes, castanhas e legumes. Enquanto os humanos modernos não evoluíram muito desde os dias do homem paleolítico, nosso estilo de vida (ficamos mais sentados) e dietas (o crescimento dos grãos e do açúcar) pioraram, o que explica o motivo de tanta gente estar acima do peso ou diabética.
Mas ao invés de justficar minha dieta através dessa mitologia histórica (que tem sido repetidamente questionada e criticada por biólogos e outros), eu descobri que é mais escapar dessses momentos em churrascos com uma resposta muito menos técnica: "Não se preocupe", eu digo enquanto espeto a linguiça sem pão. "É só para ter boa aparência".
Alguns dos meus observadores vão rir. Outros vão desdenhar. E o resto vai simpatizar. Mas apelar para saúde ou vaidade, ao invés de montar uma defesa intelectual dos meus modos pseudo-paleodlíticos, usualmente consegue o que eu quero – que é o fim-de-papo.
Evitar uma típica discussão pró-paleo ("é a maneira como evoluímos para comer!") nega aos céticos a chance de esticar a conversa ao me lembrar do absurdo de tomar um smoothie de couve quando nossos ancestrais claramente não tinham um mixer. Ao invés, eu deixo claro que não ligo a mínima.
E embora a minha estratégia de "vaidade é a melhor política" originalmente fosse uma maneira esperta de evitar o jogo dos críticos, à medida que eu uso esse argumento em mais e mais detratores, eu percebi como isso estranhamente subverte certas expectativas sobre nossas escolhas alimentares que eu não tinha percebido que existiam. Para ser claro, que a maneira como comemos é vista como uma expressão de "quem somos" ou como nos identificamos, em oposição a como nos sentir ou aparentar.
Eu flertei com paleo pela primeira vez mais de 2 anos atrás, como parte de um esforço renovado para me comprometer com a minha saúde depois que um término de relacionamento e uma mudança de carreira trouxeram, como por vingança, a ansiedade e a insônia com a qual lutei por aproximadamente uma década. A única coisa que funcionava (além de medicação, e ainda assim era por pouco) era atividade física intensa – o trabalho pesado que eu desepenhava trabalhando em uma fazenda ou na construção civil; as longas horas que eu gastava dançando durante a faculdade; as corridas de 10 milhas que eu encarava quando membro do time de atletismo do colégio. Um box de CrossFit tinha acabado de abrir na minha vizinhança em Los Angeles, então ahcei que poderia experimentar – por sua reputação de malhações que te faziam querer morrer.
Foi uma grande decisão: pela primeira vez na minha vida adulta, achei um regime de exercícios que me fazia voltar no dia seguinte. Meu corpo ficava tão exausto que meus problemas de sono rapidamente sumiram. Ganhar músculos e queimar gordura atiçaram meu senso de vaidade, mas eu também me vi ficando mais forte e melhor em rotinas complicadas de ginástica e levantamento de pesos. Não surpreendentemente, isso não era suficiente par aimpressionar os coaches no box, que me diziam o tempo inteiro que "as coisas vão realmente começar a acontecer quando você mudar para paleo".
Inicialmente eu fiquei horrorizado – por que eu iria querr abandonar tantas coisas que amava comer ? Mas eu sou do tipo que experimenta coisas novas e entra de cabeça quando gosta. Comparado a outras dietas orientadas ao fitness, tais como a Zone Diet, paleo parecia prática em seu minimalismo. Ali estava uma lista de coisas que eu poderia comer o quanto quisesse, sempre que quisesse (não havia nenhum benefícil financeiro para o box de CrossFit se eu adotasse paleo, então eu sabia que eles não estavam simplesmente querendo me vender algo).
Logo eu estava na mercearia enchendo meu carrinho com leite de amêndoa, couve e coxas de frango. Comecei a viver de smoothies veganos, punhados de castanhas;, grandes desjejuns de ovos, salsicha e legumes; saladas caprichadas com carne grelhada, sementes e montes de abacate. Cortei a cerveja, pão, queijo e iogurte – o que foi doloroso – mas rapidamente descobri que estava feliz somente com a tequila e que era mais fácil eliminar certos alimentos (especialmente pães, confeitos e chips) do que tentar comê-los com moderação e falhar. Eu comia mais vegetais folhosos e legumes do que nunca, e apesar de achar estranha a proeminência da carne na minha dieta, não estava convencido de que era muito mais que o usual.
As mudanças aconteceram repentinamente. Em semanas, percebi que aparentava e me sentia diferente. Meu sono estava melhor. Meu cabelo brilhava mais. E eu estava ficando quase embaraçosamente musculoso, ao ponto em que meu corpo simplesmente levantava explicações. Paradoxalmente, amigos apertavam o meu braço que estava ficando mais grosso, mas depois se arrepiavam quando eu revelava o "segredo" por trás do ganho.
"Quando eu descobri, pensei 'Hmm, Zak parece esperto demais para isso?'", meu amigo Dan recentemente me disse. Em parte, ele questionava a precisão da visão de mundo paleo que assumia que eu estava comprando, mas também, acrescentou, "a 'idiotice' de tudo isso certamente tem ligações com o CrossFit e os 'bombadões' – tanto suas dietas quanto a sua densidade de massa cinzenta".
Outros encrencam com a seletividade de tudo, em um momento em que parece que mais e mais opções alimentares ficam fora dos limites de consumo. "Eu também julgo os sem-glúten", disse minha amiga Molly. "E os veganos. Eu julgo qualquer coisa que tenha um traço extremo qualquer".
Os ambientalistas encheram a minha paciência sobre meu consumo de carne. Os veganos se preocuparam com a minha saúde. Mas mais que tudo, o que as pessoas parecem encrencar é com o fato de que pessoas que são paleo simplesmente parecem falar demais sobre o assunto – um hábito que no melhor caso é monótono e no pior é ofensivo e crítico. (Um amigo me disse que ele não consegue lidar com pessoas que não comem glúten porque já lhe disseram vezes demais que abandonar o glúten magicamente vai curar sua depressão).
De fato, talvez haja uma reação tão forte às notícias de que alguém é paleo por causa da tendência de que tantos de nós na "comunidade" de proselitizar. Não é o suficiente ter descoberto o que funciona para si – elas querem garantir que todo mundo saiba, via Instagram ou exibindo suas saladas para os seus colesgas de trabalho comedores de pizza. Para alguns, é mais que uma dieta, é um movimento que estende-se para idéias sobre exercício, sono, higiene e sexo baseados em como nossos ancestrais poderiam ou não poderiam ter feito tais coisas. "É como tomar a pílula vermelha ou a azul em 'Matrix'; uma vez que você toma a vermelha, não há volta", uma mulher das cavernas modernas disse ao New York Times. “É o buraco do coelho.”
Que é o motivo pelo qual – cada vez mais – eu tento ficar calado sobre o que estou comendo e o porquê (exceto, é claro, pelo que acabo de confessar aqui). Apesar de minhas tentativas anteriores com paleo serem mais estritas, atualmente eu digo "não" quando alguém me convida para jantar e pegunta se tenho restrições alimentares. Se cerveja é a única coisa para se beber, eu aceito. Tento o máximo possível evitar que a minha alimentação seja notada ou um tópico de conversas. E se levantam o assunto, eu a reduzo ao plano da superfície, não da identidade. Porque o que é alimentar-se de maneira paleo, se não simplesmente reduzir as calorias – também conhecido como o truque mais velho do livro de dietas ? Margaritas trocadas por tequila e água com gás. Pão de hambúrguer trocado por folhas de alface. Espaguete de abobrinha ao invés de massa. Afinal de contas, o que poderia ser mais monótono do que falar sobre calorias?
Mas parece que em uma cultura alimentar que transformou café em símbolo de status e "sem glúten" em uma marca de relevância cultural, nós reinterpretamos a expressão "você é aquilo que come" não para significar que a sua saúde é produto do que põe na boca, mas um símbolo cultural, político e social também.
O resultado ? É quase impossível ser paleo em paz.
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